segunda-feira, 28 de abril de 2014

Construir uma nova alternativa para o Brasil




 
(*) Geraldo de Majella

       

        A aliança formada em torno das candidaturas de Eduardo Campos e Marina Silva é a possibilidade de constituição de uma nova hegemonia política no Brasil. O PSB, a REDE e o PPS têm experiência e maturidade para dialogar com a população sem as intermediações tradicionais. Isto não significa dizer excluir as agências tradicionais como os sindicatos, associações de classes etc., mas procurar o diálogo com as massas que não são representadas por essas agências da sociedade civil.

        O momento que o Brasil vivencia é de transformações e de mudanças na forma de fazer política. As mediações realizadas pelos partidos políticos e demais agências da sociedade civil são parte do mundo onde as práticas tradicionais realizadas a partir das cúpulas estão sendo postas em xeque pelas ruas.

        As manifestações de julho de 2013 são indicativos evidentes de que o que vem sendo praticado pelos partidos políticos, pelos governos, pelos parlamentos e pelo Judiciário em todas as suas instâncias está dissociado do mundo real, do mundo das  ruas. 

        Os dois candidatos, Eduardo Campos e Marina Silva, têm juventude e propostas para inovar e renovar as práticas políticas e para transformar temas secundários aos olhos dos gestores em temas centrais do programa de governo e administração pública.

        A REDE tem na sustentabilidade a sua principal bandeira. É sabido que a defesa do meio ambiente foi a motivação de toda uma vida de Marina Silva.

        O PSB e o PPS devem incluir a questão da educação e da segurança pública como eixos centrais do Programa de Governo da candidatura de Eduardo Campo e Marina Silva.

        A inflação foi eliminada do cenário econômico e político nacional depois de mais de 30 anos de intensa luta para debelar o dragão inflacionário do imaginário e da vida real, principalmente dos assalariados brasileiros. Manter a inflação em níveis civilizados se tornou uma política central para todos os governos a partir de Itamar Franco.

        A nova alternativa poderá ser gestada com a necessária coragem de quem quer ousar uma nova forma de fazer política no Brasil do século XXI − sem perder o foco no desenvolvimento com sustentabilidade, inclusão social e equilíbrio entre as regiões.

(*) Historiador e dirigente estadual do PSB/AL

         

quinta-feira, 24 de abril de 2014

50 anos do golpe militar (VII)


 

 

 

(*) Geraldo de Majella

 

        As informações a respeito das prisões em Alagoas, entre 1964 e 1985, ainda não estão consolidadas. Algumas relações de presos os jornais publicaram nos primeiros meses de 1964, período em que se verificou o maior contingente de pessoas presas.

           Os presos na cadeia pública de Maceió passaram por triagens. Muitos dos detidos sob qualquer pretexto ou acusação sem “justificativa” tinham sido vítimas de alcagüetes e foram soltos; outros responderam a Inquérito Policial Militar [IPM], sobretudo os dirigentes sindicais, trabalhadores rurais, operários, portuários, jornalistas, dirigentes comunistas, estudantes, proprietários rurais e comerciantes.   

Quem era funcionário público e estava preso, era demitido, sem possibilidade de defesa. O historiador Dirceu Accioly Lindoso, funcionário do Departamento de Cooperativismo da Secretaria de Agricultura, tomou conhecimento de que havia sido publicada no Diário Oficial a sua demissão por ato do governador Luís Cavalcante.

De uma das relações divulgadas pelos jornais constam as seguintes pessoas: Alan Rodrigues Brandão, Alcides Correia do Nascimento, Amaro Bezerra Cavalcante, Antônio Pinheiro de Almeida, Antônio Saturnino do Nascimento, Auro Calazans de Albuquerque, Avelino Francisco da Silva, Cícero Martins de Oliveira, Dirceu Lindoso, Dorival de Araújo Lins, Eliezer Francisco de Lira, Ernande Maia Lopes, Etevaldo Dantas dos Santos, Etiene Pires de Melo, Gerson Ferreira de Souza, Gerson Rolim de Moura, Gilberto Soares Pinto, Jair Braga, Jayme Miranda, João Araújo, Jonas Paulino de Oliveira, Jorge Lamenha Lins (Marreco), José Alípio Vieira, José Cabral Irmão, José de Sá Cavalcante, José Gomes da Silva, José Gonçalves de Lima, José Graciano dos Santos, José Lopes da Rocha, José Moura Rocha, José Nunes de Almeida, Josenildo Ferreira, Luiz Gonzaga Alves, Luiz Silva Barros, Manoel Hermógenes Gomes da Silva, Manoel Lisboa Filho, Manoel Moreira da Silva, Maria Augusta Neves de Miranda, Marinete de Araújo Neves, Mário César Viana de Melo, Mário Correia da Silva, Mário Rodrigues Calheiros, Miguel Bertoldo da Silva, Ogelson  Acioly Gama, Pedro Epifânio dos Santos, Petrúcio Lages, Renalvo Siqueira, Roland Bittar Benamor, Rholine Sonde Cavalcanti Silva, Rubens Colaço, Teófilo Alves Lins, Waldomiro Pedro da Silva e Walter Pedrosa.[1]

Os últimos presos, soltos em fevereiro de 1965, oito meses depois do golpe, foram: o jornalista e secretário-geral do PCB Jayme Amorim de Miranda, o líder sindical bancário Roland Bittar Benamor, o advogado José Moura Rocha, o historiador e dirigente estadual do PCB Dirceu Accioly Lindoso, o líder sindical e dirigente comunista Rubens Colaço Rodrigues, o funcionário público José Alípio Vieira Pinto e o trabalhador têxtil João Moura (Cotó).

Dos primeiros registros de tortura em Alagoas, entre os presos políticos, o mais conhecido é o do líder sindical Rubens Colaço, torturado fisicamente pela equipe do delegado da Polinter Rubens Quintella. Colaço teve as unhas dos pés e das mãos arrancadas por alicates, foi submetido a sessões de afogamentos e à simulação de fuzilamento.  

Os golpistas ocuparam as ruas centrais de Maceió. As manifestações de apoio ao golpe haviam acontecido no dia 29 de março, sob a liderança da Igreja Católica, à frente o arcebispo de Maceió, Dom Adelmo Machado. Engrossavam a passeata senhoras católicas e representações da elite política e econômica de Alagoas. Ao consolidar o golpe, sem que houvesse nenhuma reação, as mesmas forças sociais e econômicas  voltaram às ruas, com entusiasmo ainda maior, como publica o jornal “Gazeta de Alagoas” na edição do dia 3 de abril, com a manchete de primeira página: “Maceioense festejou a vitória da Democracia”.

O arcebispo metropolitano Dom Adelmo Machado celebrou uma missa em ação de graças após a passeata que contou com o apoio das entidades representativas da indústria e do comércio. Tais entidades eram: o Movimento Democrático Feminino, colégios católicos, Conservatório Brasileiro de Música (secção Alagoas), Patrulha Nacional Cristã, Associação Comercial, Federação das Indústrias e Clube dos Lojistas.

Prisões no pós-64 aconteceram em 1968 na cidade de Água Branca, no povoado de Pariconha (hoje município). Um grupo de militantes da Ação Popular (AP) foi preso quando ainda se achava no processo de estruturação para a formação de quadros destinados à guerrilha rural.

Estavam entre os presos o dirigente nacional da AP e ex-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Aldo Arantes, Gilberto Franco Teixeira, ex-dirigente da UNE-Goiás, Maria Auxiliadora Arantes, Rosa Teixeira e três crianças, filhos dos dois casais. Também foram presos os camponeses José Correia, Josué Correia, José Gomes Novaes e José Quintino.

Em Maceió foi presa a assistente social Maria Lúcia Ferreira, levada para o presídio feminino na cidade de Pilar (AL), onde ficou alguns meses. Ao ser solta, passou a viver na clandestinidade em Salvador, São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, e só reapareceu em Alagoas após a anistia, em 1979.

O estudante de engenharia e professor Ronaldo Lessa foi preso em dois momentos, em 1969 e em 1971. Foi processado e absolvido na 7ª auditoria militar em Recife. O presidente do Diretório Central dos Estudantes da UFAL, Jailson Boia Rocha, estudante de engenharia, havia sido preso a primeira vez em 1964; em 1970 é preso pela segunda vez, afastado do DCE, enquadrado na Lei de Segurança Nacional (LSN) e condenado a seis meses de reclusão, pena cumprida na Penitenciária São Leonardo, em Maceió.

 Os militantes do Partido Comunista Revolucionário (PCR), estudantes, profissionais liberais, parentes e amigos foram presos pelo Exército em 1973, em Maceió. Foram eles: os irmãos Denis e Breno Jatobá Agra, os irmãos Jeferson e Fernando Barros Costa, Denisson Cerqueira Menezes, Norton de Morais Sarmento, Flávio Lima e Silva, Hélia Mendes, Luiz Barros Nogueira, Maria Helena da Silva, José Mário Cavalcante e Vera Costa.

As pesquisas a serem realizadas na imprensa alagoana, na 7ª Auditoria Militar e no setor de cartório da Polícia Federal, revelarão o número exato e as circunstâncias em que foram presos durante a ditadura civil-militar. 

Fontes:

Majella, Geraldo de. Rubens Colaço: Paixão e vida – A trajetória de um líder sindical. Recife, Edições Bagaço, 2010.

Ticianeli, Edberto. Especial para o “Repórter Alagoas”, 31 de março de 1964.

Silva, Amaro Hélio Leite da. Serra dos Perigosos – Guerrilha e índio no sertão de Alagoas. Maceió, Edufal, 2007.

Oliveira, José Alberto Saldanha de. A Mitologia Estudantil, Uma Abordagem sobre o Movimento Estudantil Alagoano. Maceió, Secretaria de Comunicação Social do Governo de Alagoas/Sergasa, 1994.

 

(*) Historiador



[1] Ticianeli, Edberto. Especial para o “Repórter Alagoas”, 31 de março de 1964.
 

sábado, 19 de abril de 2014

50 anos do golpe militar (VI)


 
Os advogados (sentados) José Moura Rocha e Antonio Aleixo
 

(*) Geraldo de Majella

            O papel dos advogados na defesa de presos e perseguidos políticos durante a ditadura civil-militar (1964-1985) deve ser ressaltado, pois esses profissionais, de um modo geral, portaram-se com coragem, compromissados com o Estado de Direito; além disso, demonstraram bravura no enfrentamento à tortura, às mortes e aos desaparecimentos de centenas de presos políticos.

            O acompanhamento pelos advogados dos processos e dos presos em audiências, desde os primeiros dias do mês de abril de 1964, enfrentou obstáculos colocados pelos golpistas. O impedimento do exercício da profissão chegou ao extremo com ameaças explícitas ou veladas, prisões e seqüestro, tortura e assassinatos de advogados.

            Passados 50 anos do golpe civil-militar, é importante deixar registrado os nomes dos advogados que correram todos os riscos − juntamente com os seus clientes −, para que as futuras gerações tomem conhecimento daqueles que lutaram pelo Estado de Direito e defenderam com dignidade os seus clientes.

            Ainda não se sabe o número exato de presos políticos em  Alagoas de 1964 a 1985, mas dos nomes dos advogados é possível lembrar e deixar registrado.   

O presidente da OAB/AL, José Verres Domingues, no período mais duro do regime militar deslocou a OAB da posição de apoio à ditadura e se posicionou em defesa dos presos políticos, correndo todos os riscos. A OAB/AL não havia esboçado qualquer defesa ou solidariedade aos advogados presos, a saber: José Moura Rocha, Jayme Miranda e Sebastião Barbosa de Araújo.

O advogado José de Oliveira Costa, desde o primeiro instante, atuou na defesa de presos em Alagoas. José Moura Rocha, advogado do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT),  foi preso nas primeiras horas do dia 1º de abril, e contou com assistência de José Costa, dezenas de presos contaram com o trabalho profissional em Maceió e em Recife.

Luiz Gonzaga Mendes de Barros atuou em Maceió e na 7º auditoria militar da 4ª Região em Recife, onde defendeu o líder comunista Rubens Colaço Rodrigues, o engenheiro Valter Pedrosa e o estudante Ronaldo Lessa, entre outros.

            A defesa dos estudantes e irmãos Fernando e Jeferson Costa, dos camponeses de Pariconha e da assistente social Maria Lúcia de Souza foi feita por Benjamim das Neves, Antonio Aleixo Paes de Albuquerque, José Fernando Tourinho Souza e Maria Lígia Jablonka Jannuzi.  

            Mércia Albuquerque Ferreira, pernambucana, de família alagoana de São José da Lage, onde passou a infância e adolescência, exerceu a advocacia em Recife antes do golpe, mas a partir do dia 2 de abril mergulhou em definitivo na defensa de presos políticos. De início, foi o líder comunista Gregório Bezerra, quando se deparou com a cena dantesca em que o tenente-coronel Darcy Viloque Viana o arrasta amarrado, com uma corda pelo pescoço, e o puxa com um carro do exército pelas ruas do bairro de Casa Forte. Em decorrência de sua atividade profissional foi presa 12 vezes. Esses nomes não podemos esquecer.

(*) Historiador

quinta-feira, 17 de abril de 2014

50 anos do golpe militar (V)


 
O senador Paulo Brossard, Moura Rocha e José Costa, em 1978.


 
José Costa candidatoi a governador de Alagoas em 1982, pelo PMDB.

 

(*) Geraldo de Majella

 

O golpe civil-militar de 1º de abril foi a porta de entrada para os vinte e um anos de ditadura que o Brasil viveu. Os primeiros atos de toda ditadura são atos de violência e de supressão das liberdades. A ditadura brasileira não seria diferente; em Maceió, as prisões começaram ainda na madrugada do dia 1º de abril. Ao amanhecer do dia, a polícia foi até a sede do semanário comunista A Voz do Povo, na rua do Comércio, invadindo, depredando e sequestrando os bens e documentos.

A sanha violenta continua, e no dia 3 de abril o Comandante da guarnição federal, o 20º Batalhão de Caçadores (20 BC), envia ao presidente da Câmara Municipal um ofício exigindo a cassação dos vereadores Nilson Miranda, Jorge Lamenha (Marreco) e Claudionor Sampaio. O sinal de domínio do Parlamento é dado através de um ofício, ao exigir a cassação sumária de mandatos parlamentares conquistados através do voto popular.

O presidente da República deposto e a caminho do exílio, milhares de presos políticos confinados em cadeias em todas as unidades de federação. Os militares tomam o poder pela força, e uma sucessão de Atos Institucionais (Ais) foi editada, todos com a marca expressa de violência, cassando mandatos parlamentares e executivos (governadores, prefeitos e o presidente João Goulart), extinguindo os partidos políticos e impondo a censura à imprensa.

Em Alagoas, após as cassações dos vereadores de Maceió e de algumas cidades do interior, é chegada a vez dos deputados estaduais Cláudio Albuquerque, Claudenor Albuquerque, Sebastião Barbosa de Araújo, Pedro Temóteo, e dos suplentes Jayme Miranda e Cyro Casado Rocha. 

O prefeito Sandoval Caju foi destituído do cargo e teve o mandato cassado e os direitos políticos suspensos por dez anos, assim como os demais cassados. Os deputados federais Abrahão Fidelis de Moura, Aloísio Nonô e o general Henrique Cordeiro Oest, suplente no exercício do mandato, foram cassados ainda no mês de abril.

O segundo momento de cassações se deu após as eleições de 1965. O governador eleito, Sebastião Marinho Muniz Falcão, foi impedido de assumir o cargo por artifícios casuísticos. Assume como interventor o general João José Batista Tubino, de 1º de fevereiro a 15 de setembro de 1966.

O estudante de medicina Moacir Andrade, representando a cidade de Penedo, tido como uma promessa política, eleito deputado estadual em 1965, é cassado. O conhecido coronel e chefe político de Pão de Açúcar Elísio Maia, Luiz Coutinho e Roberto Mendes tiveram os mandatos cassados e os direitos políticos suspensos por dez anos.   

O Parlamento foi durante os 21 anos de ditadura uma trincheira importante de luta legal. As perdas dos mandatos nos primeiros anos de implantação da ditadura e os bons mandatos que foram conquistados não podem ser esquecidos.

A ação parlamentar de Rubens Canuto, deputado estadual prematuramente morto, é merecedora de registro. Rubens Canuto se comprometeu com a articulação do partido de oposição possível, o MDB, ainda na década de 1960, no pós-golpe. O advogado de presos políticos, José Costa, o jornalista Mendonça Neto, o estudante  Renan Calheiros, os irmãos Djalma Falcão, Pedro Camucé Falcão e Alcides Falcão, herdeiros do legado político do ex-governador Muniz Falcão, todos estes fizeram a oposição possível pela legenda do MDB, e depois, do PMDB.

Os candidatos ao Senado Mendes de Barros e Aurélio Viana, nas eleições de 1970, enfrentam as maiores máquinas eleitorais: Arnon de Mello e Luiz Cavalcante, dois ex-governadores e homens da confiança dos militares e da elite. Os oposicionistas perdem as eleições, mas cumprem um papel importante ao ajudar na estruturação do MDB estadual. 

Em 1974 o vereador por Maceió, Pedro Marinho Muniz Falcão (Camucé), é destacado pelo MDB para concorrer à única vaga para senador contra Teotônio Vilela (Arena), recebendo em Maceió, o maior colégio eleitoral de Alagoas, uma votação extraordinária. Perde a eleição, mas faz com que a oposição se consolide na capital e em algumas cidades do interior. 

Os mandatos conquistados nas eleições de 1974 e 1978 fizeram do MDB, depois PMDB, a organização social mais importante na luta de resistência à ditadura militar em Alagoas. Os deputados José Costa (federal) e Mendonça Meto (estadual) emergiram das urnas em 1974. Em 1978, a ditadura usou de mais um artifício casuístico, a eleição indireta de um terço dos senadores, instituindo o senador biônico. Arnon de Mello recebeu o mandato da Assembleia Legislativa, dócil e castrada nas suas prerrogativas.

O MDB obteve uma votação consagradora nas eleições para o Senado com o nome do advogado e ex-preso político José Moura Rocha. A legislação casuística, criada para tentar manter a maioria parlamentar no Congresso Nacional, reelegeu o general Luiz Cavalcante ao Senado, derrotando Moura Rocha. A legislação eleitoral dificulta a eleição da oposição, o instituto da sublegenda e a proibição dos candidatos se apresentar nos programas de televisão e rádio durante a campanha eleitoral foi mais um artifício restritivo para a oposição a ditadura.

O advogado e deputado federal José Costa é reeleito, Mendonça Neto é eleito deputado federal e um jovem estudante de direito, presidente do diretório Acadêmico da Área III da UFAL, Renan Calheiros, elege-se deputado estadual, passando a representar na Assembleia Legislativa as lutas estudantis e os alagoanos que lutavam contra a ditadura militar.

As eleições de 1982 devolveram à Assembleia Legislativa a condição de Parlamento com representação dos segmentos sociais que resistiam à ditadura. Dos deputados eleitos pela oposição (PMDB), vários deles tinham compromissos com as lutas democráticas: Agripino Alexandre, Ismael Pereira, Ronaldo Lessa (ex-preso político), Eduardo Bomfim, Selma Bandeira (ex-presa política), Mendonça Neto (que desistiu de ser deputado federal para se candidatar a deputado estadual) e Moacir Andrade (que recuperara o mandato quase duas décadas depois da cassação do seu primeiro mandato, em 1966).

O senador Teotônio Vilela é a personalidade em nível federal que mais se aproxima dos que lutavam pela redemocratização do país. A voz do senador alagoano tem destaque no Congresso Nacional e nas ruas, praças e universidades pelo país afora. Desde 1975 o Menestrel da Alagoas passou mais acentuadamente a discordar da política econômica da ditadura militar.

A defesa do Programa Nacional do Álcool, da matriz energética nacional e renovável, e principalmente da redemocratização do Brasil, é encampada por Teotônio. Mas é no final do governo Geisel que a proposta de abertura política toma dimensão e significado. O senador Teotônio Vilela converte-se no defensor da abertura e da anistia para os presos, exilados, banidos e perseguidos políticos.

O senador procura os mais autênticos deputados da oposição para levar adiante a campanha pela anistia; passa a viajar pelo país, visitando centenas de presos políticos nos presídios, e a partir desse momento a defesa da anistia ganha as ruas do Brasil. Em 1979, no dia 24 de agosto, o Congresso Nacional aprova a Lei da Anistia. Não é a proposta de Teotônio Vilela e da oposição, mas é a proposta possível naquele momento da vida nacional.

O Parlamento, com todas as limitações impostas pela ditadura civil-militar, tem em Alagoas, e em todos os estados, vozes altivas combatendo os ditadores e seus aliados civis. Esses não podem ser esquecidos, nunca!

 

(*) Historiador

segunda-feira, 14 de abril de 2014

50 anos do golpe militar (IV)


                                 

(*) Geraldo de Majella

O historiador uruguaio René Armand Dreifuss, em 1987, publicou 1964: A Conquista do Estado – Ação Política, Poder e Golpe de Classe. Logo se tornou uma referência para os estudiosos do golpe civil-militar brasileiro. As revelações contidas nas 814 páginas desnudaram os golpistas brasileiros, civis e militares e os norte-americanos estimuladores e mantenedores do golpe.

Dreifuss mosta os caminhos, veredas e as veias que irrigaram as redações de jornais e rádios, as campanhas eleitorais, os militares, num mergulho profundo em  fontes documentais até então inéditas. O centro de financiamento da conspiração foi exposto como nunca havia sido antes. O que se sabia eram apenas indicativos. Dreifuss disponibiliza com suas pesquisas as comprovações.

Em seu livro constam a contabilidade e as atividades do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), organização anticomunista fundada em maio de 1959 por Ivan Hasslocher. O IBAD contava com  inumeros empresários brasileiros e estrangeiros como membros, apoiadores, contribuintes e outros como ativistas full time.  

O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), fundado em novembro de 1961, dois anos e meio depois do IBAD, por  Antônio Gallotti e Augusto Trajano de Azevedo Antunes e outros, serviu como um dos principais catalisadores do pensamento anti-Goulart e principalmente como intrumento de financiamento do governo dos EUA,  de empresarios brasileiros e estadunidenses. A finalidade inicial era combater o estilo populista de JK e possíveis vestígios da influência do comunismo no Brasil.

            O general Hélio Ibiapina revelou anos depois o que todos já sabiam: que o IBAD possuía ligações com a CIA. Em Alagoas o IBAD foi dirigido por um colegiado − pelo menos oficialmente − constituido pelos intelectuais Ib Gatto Falcão, Everaldo Macedo de Oliviera, Hélio Ramalho Ferreira e Japson Macedo de Almeida (Dreifuss: 1987:648).

            As ações coordenadas pelo IBAD e pelo IPES são abrangentes e chegam até ao financiamento de campanhas eleitorais de candidatos a governadores, deputados estaduais e federais de vários partidos, como PDC, PRP, PSD, PTB, PR, mas é notoria a vinculação com a União Democratica Nacional – UDN. Em Alagoas o IBAD financia as campanhas de três deputados federais: a do padre Medeiros Neto, a de Oseas Cardoso e a de Sigismundo Andrade (Dreifuss: 1987:334).  

            O IBAD/IPES contava em 1962 com aproximadamente duzentos parlamentares, ou seja, quase a metade da Câmara dos Deputados. Esse contigente de deputados se abrigava num bloco denominado de amigos da Ação Democrática Parlamentar, todos patrocinados pelo financiamento de campanhas eleitorais e publicidades na grande mídia e entre intelecutais de direita pelas duas organizações.

            A estratégia posta em prática pelos golpistas para bloquear as ações políticas do presidente João Goulart no Congresso Nacional, visando implantar as reformas de bases, forçava o presidente a utilizar os decretos presidenciais como instrumento de ação legislativa, fato gerador de impasses no Congresso Nacional. Tendo em vista a fragilidade numerica da banda de apoio ao govenro Jango.

 As crises oriundas dos bloqueios processuais nasciam da maioria parlamentar vinculada aos financiamentos norte-americanos e do empresariado brasileiro e estrangeiro no Parlamento; eram amplificadas na grande mídia, também financiada pelos golpistas, como sinais de crises de governabilidade.

 

(*) Historiador

  

 

 

 

             


 

quinta-feira, 10 de abril de 2014

50 anos do golpe militar (III)


 

 

 

(*) Geraldo de Majella

 

O golpe civil-militar de 1º de abril de 1964 atingiu a todos − parlamentares, juízes, ministros, religiosos,  advogados, operários, trabalhadores rurais, portuários. Em Alagoas a antiga Cadeia Pública “hospedou” centenas de patriotas, homens e mulheres. As prisões, as cassações de mandatos parlamentares, a suspensão dos direitos políticos e as torturas tiveram início nas primeiras horas daquele dia e se seguiram por 21 anos (1964-1985).

O semanário A Voz do Povo, fundado no dia 1º de maio de 1946, nas primeiras horas da manhã do dia 1º de abril de 1964 foi saqueado e destruído pelos delegados Rubens Quintela e Albérico Barros, entre outros policiais.

A ordem foi dada pelo governador Luiz Cavalcante, chefe do golpe civil-militar em Alagoas. Os jornalistas, gráficos e diretores foram presos na Cadeia Pública de Maceió. Ao tomar conhecimento do saque e das prisões, colaboradores do semanário procuraram se esconder e foram viver na clandestinidade. É o caso de Silvio da Rocha Lira, secretário de organização do PCB e diretor do semanário comunista.

O diretor-responsável, jornalista Jayme Amorim de Miranda, foi preso ainda pela manhã, sendo conduzido à Cadeia Pública de Maceió. A polícia continuou a busca dos membros da redação, da administração e colaboradores. A Polinter prendeu Valter Amorim Pedrosa, Dirceu Accioly Lindoso, José Alípio Vieira Pinto, Dalmo Lins, jornalistas e colaboradores do jornal, e a proprietária do imóvel onde funcionava o semanário, Maria Augusta de Miranda (Marinete, como era conhecida) e seu irmão, o comerciante Péricles de Araujo Neves, ambos dirigentes históricos do PCB.

 O vereador por Maceió, Nilson Miranda, editor de A Voz do Povo, vinha sendo perseguido e hostilizado pela sua atuação parlamentar. Desde o dia 30 de março não aparecia em público, passando no dia 1º de abril a viver na clandestinidade.

O ex-operário têxtil Sílvio da Rocha Lira, secretario de organização do PCB em Alagoas e administrador do semanário, passou a ser procurado pela polícia. Escapou da prisão escondendo-se no Tabuleiro do Martins. Entrou também na clandestinidade, inicialmente em Maceió; sentindo-se inseguro, sai de Alagoas, indo atuar no PCB em Pernambuco, e posteriormente em São Paulo, na organização do partido.

O historiador Moacir Medeiros de Sant’Ana, dotado do arguto senso de pesquisador, salvou as poucas, porém significativas coleções de A Voz do Povo. Esse gesto inegavelmente contribuiu para que nesse momento estivéssemos tratando da existência de pouco mais de uma centena de jornais. Não devemos associar o gesto do historiador ao salvar a coleção a qualquer simpatia com o ideário do PCB e do seu porta-voz, A Voz do Povo. 

 Precárias eram as condições em que esteve acondicionada a coleção de A Voz do Povo, na hemeroteca do Arquivo Público de Alagoas, dirigido por mais de quarenta anos por Moacir Medeiros de Sant’Ana. A atitude pouco convencional para se preservar documentos de valor histórico nem sempre ocorreu pelas vias normais. Felizmente, assim aconteceu com o semanário dos comunistas de Alagoas, como declarou o historiador:   

 

“(...) o general Bittencourt esteve aqui em Alagoas como secretário de Segurança e me convidou para que eu fosse até a Secretaria. Me lembro bem: diante dele, estava o José Fernandes Maya Pedrosa, que é coronel do Exército. O general perguntou ao coronel: 

 – Você conhece o Dr. Moacir?

 − Conheço, ele é oficial da Reserva.

 − Oh, oficial da Reserva? Ah, então vai ficar aqui comigo, na minha equipe.

 E foi ai que fiquei como assessor do general Bittencourt naquele período do Luiz Cavalcante. (...) Foi depois de abril de 64. Demorei muito tempo trabalhando com o general Bittencourt. Então, resolvi carregar (a coleção de A Voz do Povo). Não pedi, não. E se eu pedisse, eles não dariam e terminariam dando fim. Aí, tranquilamente, ‘amaciei’ o Rivoredo e, realmente, a tirei de lá e levei-a para casa. Morava bem pertinho. Aliás, mandavam me levar em casa de carro”[1].

 

O mais antigo jornal popular de Alagoas, A Voz do Povo, foi destruído pelos golpistas depois de sobreviver durante dezoito anos − de 1946 a 1964 − a  inúmeros empastelamentos e invasões policiais nos governos de Silvestre Péricles de Góis Monteiro e Arnon de Mello. O semanário foi fechado e nunca mais voltou a ser publicado, a não ser em algumas poucas edições comemorativas na década de 1980.

 

(*) Historiador



[1] Depoimento prestado ao autor pelo historiador Moacir Medeiros de Sant’Ana, em 19 de agosto de 2005.

 

terça-feira, 8 de abril de 2014

50 anos do golpe militar (II)


Rubens Colaço discursando na inauguração da rua Jayme Miranda

(*) Geraldo de Majella

        As articulações golpistas civis e militares vinham acontecendo nos estados e nas principais cidades há tempo. Desde o suicídio de Getúlio Vargas os militares das três armas procuravam a melhor oportunidade para deflagrar o golpe, não foi possível impedir a posse de Juscelino Kubitschek, a oportunidade se apresenta alguns anos depois no governo de João Goulart, em abril de 1964.

A partir de 1962 o golpe entra na agenda política do presidente John Kennedy, tendo o embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln Gordon, como o idealizador e estrategista mais qualificado.

Contava com a participação de políticos udenistas e de outras siglas, governadores, senadores e deputados, empresários, religiosos e da quase totalidade da grande mídia nacional fartamente subsidiada por recursos oriundos da Agência Central de Inteligência (CIA), Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad) e Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipês).  

O comandante da 4ª Região Militar, general Mourão Filho, sem que houvesse combinado com os líderes golpistas, desce a serra de Juiz de Fora (MG) em direção ao Rio de Janeiro, na madrugada do dia 1º de abril de 1964, antecipando o golpe.

        Em Maceió, distante 1.948 km, o governador de Alagoas, general Luiz Cavalcante, amanheceu o dia transmitindo e recebendo informações. O aparelho de radiotelegrafia do Palácio dos Martírios funcionou durante a noite e a madrugada do dia 31 março e 1º de abril.

        Os secretários de Estado foram convocados pelo governador em caráter extraordinário. Em depoimento ao autor, o então secretário da Fazenda, Divaldo Suruagy, recebeu em sua residência, no bairro da Cambona, o chefe do gabinete militar coronel Cícero Argolo, convocando-o para uma reunião em palácio.

Suruagy, testemunha privilegiada dos acontecimentos, disse: “[...] O comandante do 4º Exército, general Justino Alves Bastos, através de rádio, tinha aderido à revolução, e o Major Luiz, da UDN, correligionário de Carlos Lacerda, adversário do Jango, decidiu pela Revolução. Era uma questão política. [...] Nós ficamos de 31 até o dia 1º no palácio, reunidos, batendo papo, conversando. Quem comandou o processo das prisões foi o coronel João Mendes de Mendonça, secretário de Segurança Pública, com o apoio do Rubens Quintela e do (Albérico Barros) Barrinhos. Eles transformavam as ordens de prisão em realidade”[1].

O presidente do sindicato dos motoristas de Alagoas, Rubens Colaço Rodrigues, foi o primeiro preso político, no amanhecer da manhã de 1º de abril.

Do livro Rubens Colaço: Paixão e Vida – A trajetória de um líder sindical (Edições Bagaço, 2010), publicamos este trecho.   

Você foi preso no dia 1º de abril? Como se deu a sua prisão?

− Sim. Foi no dia 1º de abril e foi o Rubens Quintela quem executou a minha prisão. Ele parou o carro em que vínhamos de Pernambuco, no Tabuleiro do Martins, por volta das três horas da madrugada, dizendo:

– Você é Rubens Colaço?

– Às suas ordens.

– Está preso?

– Por quê?

Ele falou grosso:

– Nós fizemos uma revolução e vocês perderam; desça, venha cá.

Foi me escorando numa guarita, ali onde foi a Petrobras, Tabuleiro do Martins, e perguntou:

– Onde estão as fardas de guerrilheiros que você foi buscar no Recife, vindas de Cuba?

Falei sério:

– Devem estar aí no carro. Seus homens já devem ter achado.

Mas eu falei aquilo por pura ironia; aí ele engatilhou a metralhadora e disse:

– Olha, a sua vida está nas minhas mãos. Não tome deboche não, que você morre. Eu calado estava, calado fiquei. Ele olhou para mim uns trinta segundos e desengatilhou a metralhadora, botou no ombro e disse:

– Olha, Colaço, vou lhe dar uma oportunidade. Sabendo que se eu estivesse em suas mãos você não me daria.

Ordenou para os seus esbirros que estavam parados em pé, observando o diálogo:

– Levem o homem.

O que ocorreu em seguida?

− Nos levaram direto para a Secretaria do Interior e Segurança Pública, na Praça dos Martírios, depois para a penitenciária. Estranhei o fato do Expedito, o Expedito de..., era um rapaz funcionário da Petrobras, não me lembro o sobrenome dele. Nós ficamos presos e ele foi num carro especial para casa, onde os pais dele moravam, na usina Utinga Leão.

E vocês foram levados presos para a penitenciária?

− E nós fomos levados para a penitenciária, já amanhecemos o dia na cela 12. Fomos os primeiros a chegar. Quando foi às oito horas da noite, a cela 12, onde nós estávamos, que só cabia 24 homens deitados marcando cartão um no outro, tinha 28; então 12 ficaram na grade, na porta de entrada, e 12 ficavam na janela, que dava para o sanitário, acordados; aí depois, quando cansavam, iam para lá, fazíamos um revezamento, tinha sempre quatro acordados e 24 marcando cartão um no outro. O mesmo acontecia nas demais celas, na 13, em todas, enfim. No dia 4 de abril éramos 151 presos.

(*) Historiador.

 

 

 

 

 

 



[1] Entrevista ao autor prestada no dia 19 de fevereiro de 2000.