segunda-feira, 31 de maio de 2010

Jacinta Passos, Coração Militante


Será lançado no dia 8 de junho próximo, a partir das 18 horas, no Espaço Unibanco do Cinema Gláuber Rocha, na Praça Castro Alves em Salvador, o livro Jacinta Passos, Coração Militante. O volume traz a obra completa de uma poetisa baiana importante, elogiada por críticos influentes, mas que, por falta de circulação de suas obras, hoje está praticamente esquecida: Jacinta Passos (nascida em 1914, falecida em 1973), poetisa, professora, jornalista, militante do Partido Comunista, feminista: uma mulher adiante do seu tempo, que teve uma vida muito difícil. O livro é uma publicação conjunta da Editora da Universidade Federal da Bahia e da Editora Corrupio, com apoio da FAPESB, e foi organizado pela filha de Jacinta, a historiadora Janaína Amado. O volume é ilustrado com belos desenhos de Lasar Segall e um caderno de fotos.

Jacinta Passos, Coração Militante

Local: Espaço Unibanco do Cinema Glauber Rocha
Praça Castro Alves – Salvador – Bahia
Dia: 8 de junho
Horário: 18 horas

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Livraria Sodiler: mantenha distância!



Geraldo de Majella

O fim das livrarias em Maceió foi decretado. Restam poucas, sete apenas. Quatro pertencem à rede Nossa Livraria Editora, de Pernambuco, duas são do conglomerado nacional Laselva/Sodiler e uma da Editora da Universidade Federal de Alagoas (Edufal).

Há em Alagoas inúmeros escritores e não seria possível afirmar quantos são. Mas certamente já ultrapassa a casa dos quinhentos escritores. São poetas, contistas, romancistas, memorialistas, historiadores, sociólogos, juristas, antropólogos, cientistas sociais e políticos, geógrafos, arquitetos, agrônomos, teatrólogos, músicos − para ficar apenas nessas áreas.

No entanto, a Livraria Sodiler desconhece olimpicamente a existência dos escritores alagoanos. O escritor alagoano está vetado nas livrarias da rede Laselva/Sodiler.

No domingo, dia 2 de maio, fui ao Maceió Shopping e me dirigi à Livraria Sodiler. Qual não foi a minha surpresa, encontrei numa prateleira destinada a escritores regionais algo em torno de 15 autores alagoanos, que faço questão de nominar: Divaldo Suruagy, Hidelbrando Gentil de Oliveira, Alfonso Dacal, Kátia Oliveira, Ivanksuel Amorim, Miriam Rodrigues, Solange Lages, Devis Melo, Roberval Davino, Vinicius de Paula, Maria de Lourdes do Nascimento, Silvio Teles, José Coelho Neto e Sheila Malta Amorim.

Os autores citados são autores alagoanos ou residem aqui e não deveriam estar na categoria dos escritores regionais.

Dirigi-me a um dos funcionários e perguntei se na livraria tinha algum livro de Graciliano Ramos, Jorge de Lima ou Lêdo Ivo. Depois de consultar a listagem no computador, veio a resposta, lacônica:

− Não temos.

Fiz mais uma pergunta:

− Há previsão de quando esses autores estarão à venda?

− Não, não há, senhor.

Para finalizar, arrematei:

− Tem o dicionário do Aurélio?

Novamente o funcionário pesquisou na listagem do computador.

− Infelizmente, não temos, senhor.

Agradeci e fui embora tomar um café, boquiaberto com a inusitada situação.
O que devemos esperar de uma rede de livraria que não dispõe de uma obra sequer de quatro grandes escritores da literatura e da língua portuguesa?

É notória a intenção – no meu entendimento − de burlar a lei municipal, de autoria do vereador Silvio Camelo, que estabelece um percentual mínimo de 10% de autores alagoanos a serem comercializados nas livrarias de Maceió.

Leitor, amigo, mantenha distância da livraria Sodiler!

terça-feira, 18 de maio de 2010

Como me tornei são-paulino

Com Isabela em São Paulo

São Paulo bicampeão de 1971. Em pé: Jurandir, Sérgio, Gilberto, Arlindo, Edson e Forlan. Agachados: Terto, Pedro Rocha, Toninho Guerreiro, Gerson e Paraná.

Geraldo de Majella


O presidente Juscelino Kubitschek governou com entusiasmo e conduziu o Brasil com o lema “Cinquenta anos em cinco”. As metas definidas foram ao encontro dos anseios da população. O país entra numa nova era, indústrias são instaladas e com isso também são criados empregos em todas as regiões. Havia tantos que era possível escolher.

Levas de nordestinos foram trabalhar em São Paulo, Rio de Janeiro, no norte do Paraná ou foram juntar-se aos milhares de operários e técnicos que estavam entusiasticamente construindo Brasília, a nova capital.

Muitos jovens saíram de Anadia em Alagoas e foram trabalhar nas novas frentes de trabalhos. São Paulo era a cidade que mais atraia mão de obra.

Os irmãos Ezequias e José Fidelis, o primo Abraão e os amigos José Cláudio e Áureo foram para São Paulo de pau de arara, em cima de um caminhão. Viajaram em condições terríveis, na esperança de encontrar trabalho − o que de fato aconteceu, pois todos logo se empregaram na indústria paulistana.

Áureo, negro forte, trabalhava em Anadia como carregador de sacos e ajudante de caminhão. Em São Paulo não se apertou. Foi trabalhar numa firma como ajudante. Era do pesado, sério, trabalhador.

Houve uma mudança essencial na vida desses jovens. Por muitos anos continuaram morando juntos, mas nem todos desejavam se fixar efetivamente na cidade. Um desejo incontido permaneceu: o de voltar a viver em Anadia.

Os domingos eram destinados ao lazer, bebidas, jogos, mulheres e futebol. Áureo, em meio a santistas, time que estava ganhando tudo, tinha Pelé, Coutinho e Pepe. Era a certeza de vitória. Torcia pelo São Paulo Futebol Clube, o time da elite paulistana, pelo menos era assim considerado.

As tardes de domingo no Morumbi eram sagradas quando o seu time jogava. Canhoteiro, o maior ponta-esquerda do futebol brasileiro, era o seu ídolo, de quem não se cansava de falar, imitar, reproduzir jogadas. Negro, do Maranhão, nordestino como Áureo.

Em São Paulo tinha trabalho, o salário estava além da expectativa, mas a saudade da terra natal e dos amigos era mais forte. A volta foi se desenhando até se consumar. Retornou para Anadia e voltou a trabalhar como ajudante de caminhão no armazém do “Seu” Antonio.

Aquela massa compacta de músculo em forma de gente era fascinante para os meus olhos de criança. Falava de um mundo que ninguém conhecia, descrevia jogadas imaginárias, muitas delas prendiam a minha atenção e a das outras crianças.

Realizava movimentos rápidos com as mãos e com o corpo carregando sacos de setenta ou oitenta quilos, subia na prancha para arrumar as cargas dos caminhões, umas vezes de algodão, outras de mamona, e na maioria das vezes couro de animais.

O assunto recorrente era futebol e as proezas do São Paulo Futebol Clube. A escalação de várias formações do time era desfiada em voz alta. Os comentários eram de quem conhecia e, mais que isso, tinha visto os jogos com visão privilegiada: da arquibancada do anel superior do estádio do Morumbi.

Aquele negro musculoso, um gladiador africano em terra anadiense, era a pessoa a quem eu mais admirava. Nem meu pai tinha tantos argumentos sobre futebol. Aliás, de futebol meu velho pai não entendia nada. Os meus primos, considerados ricos e cheios de pose, também não sabiam nada. O cara era o negro Áureo.

Foi por meio dos seus comentários apaixonados que ouvi pela primeira vez falar de um certo Eder Jofre, campeão mundial de boxe e são-paulino. Áureo era seu admirador. Tudo se encaixava: negro musculoso, são-paulino e apaixonado por boxe.

O círculo de minha admiração infanto-juvenil se fecha quando, alguns anos depois, da porta de minha casa presencio a sua prisão. Morei durante anos em frente à cadeia e presenciei inúmeras cenas de maus-tratos e tortura a presos. Essa seria mais uma.

A Polícia Militar foi chamada para prender o Áureo. O motivo alegado foi arruaça na rua. De fato quando ele bebia ficava muitas vezes agressivo, transtornado com o efeito do álcool.

A prisão para os policiais era mansa e pacífica até chegar próximo à cadeia. Faltando alguns metros, Áureo resiste e sai no braço com os quatro policiais. O resultado: não houve condições de prendê-lo naquele instante; deixou o destacamento policial no chão e foi-se embora.

O tumulto se formou e houve necessidade de chamar reforço policial. A prisão ocorreu depois, mas em outras condições: sob a mira de armas de fogo e cassetete.

A minha admiração, que era grande, a partir daquele instante redobrou. O Negro Áureo tornou-se o meu herói dos tempos de infância. Um campeão, um Eder Jofre negro e musculoso de Anadia. Nunca mais saiu da minha lembrança.

Foi assim que me tornei são-paulino.

O time do São Paulo de 1971, bicampeão paulista, também não saiu da minha memória. A linha com Terto, Pedro Rocha, Toninho Guerreiro, Gerson e Paraná. O título mundial dos penas ganho por Eder Jofre, em 1973.

Vinte anos depois, em 1993, quando Isabela – minha filha – nasceu, andando pelo centro velho de São Paulo, entrei numa loja na rua Libero Badaró e comprei uma camisa 10, que simboliza a arte e o craque. Naquele instante, quem vestia a camisa era Raí.

Raí foi um craque, além de símbolo de jogador elegante em campo e fora dele. Isabela é torcedora do tricolor e já teve o seu batismo: foi ao estádio Cícero Pompeu de Toledo, o Morumbi, visitar a sala de troféus do clube.

Salve o tricolor paulista !

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Os filósofos do futebol brasileiro

Comemorando mais uma vitória da seleção brasileiro na copa do mundo em 1970.

Operado nos EUA

Com a camisa do Cruzeiro

Quando jogava no Vasco da Gama



“A bola não enxerga, é o artilheiro que sabe antes dos outros aonde a bola vai chegar.”

“A disciplina sem criatividade está próxima da mediocridade.”

Sobre os pênaltis

“O pênalti depende muito do estado emocional de quem bate, de treinos, da competência do goleiro e da sorte.”

“Agora os presidentes estão tão sem moral que é melhor bater mesmo o jogador.”

“ Pênalti é loteria.”
[Sabedoria popular]

“O pênalti é tão importante que deveria ser batido pelo presidente do clube.”
Neném Prancha


Tostão - Eduardo Gonçalves de Andrade [1947], nasceu em Belo Horizonte, jogou no Cruzeiro e no Vasco da Gama, foi tricampeão de futebol na copa do Mundo de 1970 no México. Em virtude de uma bolada no olho foi lesionado, tendo que se submeter a várias cirurgias deixou prematuramente de jogar futebol aos 26 anos de idade. Formou-se em medicina, é comentarista esportivo de televisão e jornal. É autor do livro: Lembranças, opiniões, reflexões sobre futebol, pela DBA, São Paulo.

Fonte: 90 Minutos de Sabedoria – A filosofia do futebol em frases inesquecíveis. Seleção e organização de Ivan Mauricio, editora Garamond, 2002.

sábado, 15 de maio de 2010

A voz que encanta as noites




Geraldo de Majella

Micheline Deise de Almeida, ou simplesmente Micheline, nome artístico da cantora que tem encantado as noites maceioenses há treze anos. Por onde canta enche a casa, seja em barracas de praias, restaurantes ou bares alternativos. Homens e mulheres ficam atraídos pelo seu repertório e pela sua beleza.

É provavelmente a mais sensual das cantoras de sua geração −. atributo associado a sua voz afinada e seu repertório muito bem montado, vem cada vez mais atraindo admiradores.

A vida das cantoras e cantores que trabalham na noite não é nada fácil: cantam em pequenos palcos − quando não em calçadas −, isso para não falar de ambiente onde a acústica é imprópria. Em meio a tanta falta de condições de trabalho, são obstáculos e desafios superados através de artifício vocais e/ou performáticos.

Trabalhar na noite nunca foi moleza, não. Em qualquer época. Diante das dificuldades encontradas, a sorridente Micheline solta a voz e levanta o público. Nesses anos de estrada conquistou uma fatia de público e de fãs de causar ciúmes e dores de cotovelos às colegas de ofício.

Isso fica evidente, pois a cada casa em que se apresenta uma rede de fãs passa e repassa mensagens anunciando o novo ponto de encontro. É público garantido e casa lotada.

Não faz muito tempo abriu o show da cantora Ângela Rô Ro, no SESC – Poço, e a plateia a recebeu com entusiasmo e louvação. Sinal, quero crer, de empatia entre o público − que já a conhecia das noitadas – e o repertório montado com algumas canções clássicas da MPB, outras de compositores alagoanos, aliado a sua performance no palco.

Micheline encanta. “Som de uma saudade” é o titulo do cd que lançou em 2008; são dezoito músicas gravadas, de vários estilos e épocas. Os compositores alagoanos Marcondes e Marcos de Farias Costas, e Robson Amorim – este paulista que já se alagoanizou − são interpretados por Micheline.

Onde canta:

Be Cat Bar e Petiscaria
Avenida Jatiúca, 109-A
Maceió – Alagoas

segunda-feira, 10 de maio de 2010

O filho do Almirante Negro

João Cândido e Octávio Brandão na década de 1960

Nassif & Amigos, eis o simbólico discurso de Adalberto Cândido, filho de João Cândido, na entrega do petroleiro que leva o nome do seu pai, em Suape/Pe.


Senhoras e Senhores, meu cordial bom dia!


O lançamento ao mar do navio João Cândido, neste dia, nas águas que banham Pernambuco – este maravilhoso Estado cantado em prosa e verso como LEÃO DO NORTE – reveste-se de significado muito especial. Trata-se da primeira embarcação da fase de revitalização da indústria naval do país, pelo Estaleiro Atlântico Sul, e é primogênito da nova frota da Transpetro.

É especial porque foi o próprio presidente da República que sugeriu o nome de batismo do navio. É especial não só para a família de João Cândido e de seus companheiros marinheiros. É especial para a sociedade brasileira, pois esta homenagem, neste ano do centenário da Revolta da Chibata, consagra o reconhecimento de uma luta justa e digna travada contra os maus tratos que existiam na Marinha do Brasil, em defesa dos direitos humanos.

Não cabe aqui e agora reabrir feridas do episódio histórico. Mas é fundamental nos situarmos no que ocorreu entre os dias 22 e 27 de novembro de 1910, na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, uma semana após a posse do marechal Hermes da Fonseca como presidente da República.

Aliás, muito antes daquele período, o descontentamento dos marujos – em larga maioria, filhos de escravos ou ex-escravos, negros e mulatos, pobres e analfabetos – já era uma bomba a explodir na Marinha do Brasil. Os marujos recriminavam os castigos físicos e o excesso de trabalho. Também enfrentavam problemas com a alimentação de péssima qualidade e escassa. A lei Áurea, em 1888, não extinguiu o costume covarde da chibata aplicada aos marinheiros pelos oficiais como punição disciplinar.

As 250 chibatadas dadas no marinheiro Marcelino Rodrigues Meneses foi o estopim para a revolta. O meu pai João Cândido e mais de dois mil marinheiros, então, se rebelaram. E posso dizer que, pela primeira vez, um Almirante Negro assumiu o comando dos navios da reconhecida Esquadra Branca, que era orgulho do país, e que em 1910 era considerada a terceira potência naval do mundo.

Senhoras e Senhores,

Quase cem anos depois da Revolta da Chibata, enquanto a Marinha ainda se mantém atrelada à idéia de que o episódio foi uma insurgência, o Estado vem procurando retificar os erros cometidos contra os marinheiros.

Nesse sentido, o presidente Lula, em julho de 2008, sancionou o projeto que anistiou João Cândido e os outros marinheiros participantes da Revolta da Chibata. É bem verdade que o artigo que previa o pagamento relativo às promoções póstumas e indenizações por morte aos familiares dos anistiados foi vetado, no meu entender, injustamente. Essa reparação ainda será feita.

Quero, como representante da família de João Cândido, expressar meu agradecimento ao presidente Lula pela iniciativa tomada no sentido de acertar o episódio histórico no seu devido lugar na história brasileira.

O navio petroleiro João Cândido vai singrar a imensidão dos mares com a nobre missão de transportar riquezas naturais brasileiras. Desejo que isso possa ajudar, efetivamente, na política de desenvolvimento econômico com justiça social. Nos mares e nos portos de qualquer parte do mundo, o navio será a nossa referência de grandeza e dignidade.

Vida longa ao João Cândido.
Muito obrigado.

Por Nonato Amorim

Texto publicado no site do Nassif em 08/05/2010, às 13:33

domingo, 9 de maio de 2010

Memória & História − A Voz do Povo

Antiga sede do semanário A Voz do Povo - R. do Comércio,606 Maceió - Alagoas.

O compromisso do governador Muniz Falcão

Edição em homenagem ao ex-diretor Jayme Amorim de Miranda

A Voz do Povo foi editada cinco vezes na década de 1980

Liberdade Para Tiburcio Tenório das Neves edição de 1954


Geraldo de Majella


O semanário A Voz do Povo, órgão do Partido Comunista Brasileiro - PCB em Alagoas, começou a circular no dia 1º de maio de 1946. A redação de A Voz do Povo desde a sua fundação funcionou até a sua destruição, em 1º de abril de 1964, no nº 606 da rua do Comércio, num imóvel que pertenceu à histórica dirigente comunista Maria Augusta de Miranda (Marinete).

O primeiro diretor foi o jornalista e advogado André Papini Góes. Em 1947, Papini foi eleito deputado estadual constituinte pelo PCB. A redação era inicialmente constituída por jovens, alguns ainda estudantes, como Arnoldo Jambo, Floriano Ivo Júnior, Hélio de Sá Carneiro, Murilo Leão Rego e George Cabral, todos militantes do PCB.

As dependências d’ A Voz do Povo eram compartilhadas com a direção regional de Alagoas. A ocupação destes espaços evidenciava a ligação umbilical que havia entre o PCB e a administração, redação e oficina do jornal.

A máquina que durante décadas imprimiu o semanário era uma Marinoni com muitos anos de uso. Os tipógrafos, além dos seus afazeres, inúmeras vezes consertaram a máquina depois dos sucessivos empastelamentos.

O jornal teve três diretores durante os dezoitos anos de existência [1946-1964]: André Papini Góis, Osvaldo Nogueira e Jayme Amorim de Miranda.

Em vários momentos de sua vida o jornal teve de ser impresso em gráficas clandestinas em Maceió e no Recife. Esses fatos ocorreram durante os governos de Silvestre Péricles [1947-1951], Arnon de Mello [1951-1956] e Luiz Cavalcante [1961–1966]. O único período em que A Voz do Povo não sofreu com atos violentos foi no governo de Sebastião Marinho Muniz Falcão [1956-1961].

Nilson Miranda, antigo dirigente comunista e repórter d’ A Voz do Povo, testemunhou: “O jornal circulou durante anos em condições precárias. Mesmo assim era distribuído e lido nas fábricas, nos bairros populares de Maceió e em outras cidades de Alagoas. Foi uma escola de jornalismo.”

No dia 1º de abril de 1964 a sede do semanário foi invadida e destruída; os seus bens foram saqueados e a gráfica foi destruída. Os seus diretores foram presos. Terminou assim uma longa trajetória.

A invasão foi comandada pelos delegados Rubens Quintela e Albérico Barros, e o responsável pelo ato violento foi o comandante do golpe militar em Alagoas, o governador Luiz Cavalcante.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Aurélio, sinônimo de dicionário

Aurélio e o floclorista alagoano Theo Brandão


Aurélio recebendo parabéns de Jorge Amado no dia em que fez 50 anos

Aurélio e os amigos Heberte Sales, José Aparecido numa noite de boemia


Paschoal Carlos Magno, Braulio Leite Junior, Arnoldo Jambo e Aurélio na praia da Sereia, em Maceió

Mestre Aurélio na sua biblioteca

Aurélio Buarque de Holanda pesquisando


Geraldo de Majella


Aurélio Buarque de Holanda Ferreira [1910-1989] nasceu no norte de Alagoas, na pequena Passo de Camaragibe. Quando jovem, morando em Maceió, iniciou a sua vida profissional como professor de português. Na década de trinta foi estudar direito em Recife, onde se bacharelou.

Em Recife estudou com quatro alagoanos que se tornaram amigos de toda a vida: Aloysio Branco, Antonio de Freitas Cavalcanti, José Moraes da Silva Rocha e Mário Gomes de Barros Rêgo.

Bacharel em direito, não atuou como advogado. Dedicou-se ao magistério tanto como professor primário quanto como professor de literatura portuguesa e francesa. Trabalhou ainda como funcionário público municipal em várias funções, desde Oficial de Gabinete do prefeito Edgar de Góes Monteiro até Diretor da Biblioteca Municipal e, cumulativamente, ocupou a função de diretor do Departamento de Estatística e Publicidade da prefeitura de Maceió, em substituição a Rui Palmeira.

Mestre Aurélio fez parte de uma geração de grandes intelectuais nascidos em Alagoas, como Alberto Passos Guimarães, Valdemar Cavalcanti, Humberto Bastos, Jorge de Lima, Aloysio Branco, Carlos Paurilio, Manuel Diegues Júnior, Mário Brandão, Rui Palmeira, Raul Lima e Théo Brandão.

Acrescente-se a essa relação Graciliano Ramos, o mais velho entre eles, e os aqui residentes Raquel de Queiros, José Lins do Rego e Tomás Santa Rosa, cearense e paraibanos, respectivamente.

A vida de mestre Aurélio em Maceió e no Rio de Janeiro esteve sempre envolvida com a língua portuguesa, seja ensinando, ou como revisor de livros e jornais, seja traduzindo de línguas estrangeiras para o português, ou escrevendo contos e pesquisando.

O saber popular ajudou o mestre a criar tantas palavras e verbetes. Vivia anotando tudo, principalmente a gíria cotidiana do povo. O dicionário Aurélio foi responsável por democratizar e desmitificar nossa língua, assimilando palavras de uso coloquial e do cotidiano até então ignoradas pelas pesquisas lexicográficas.

Em 1975, o Novo Dicionário da Língua Portuguesa – sua principal obra − foi lançado. A partir desse momento tornou-se o livro mais vendido no Brasil, fazendo de Aurélio sinônimo de dicionário.

Mas quem pensa ou pensava que a vida dessa figura era de clausura, está ou esteve enganado. Um novo Aurélio sempre deixou a mesa de trabalho para sentar em outra: a da boemia. Aquele homem aparentemente circunspeto desde jovem, era conhecido como boêmio na Maceió provinciana das primeiras décadas do século XX.

Na capital alagoana, muitos amigos da época de juventude se tornaram parceiros nas rodas literárias e/ou de boemia. A maior parte da sua vida foi vivida na cidade do Rio de Janeiro, mas quando vinha passar férias em Alagoas era inevitável entrar na boemia.

Aurélio reunia-se com o jornalista Arnoldo Jambo, o teatrólogo Bráulio Leite Júnior, o poeta Carlos Moliterno, o cronista e político Teotônio Vilela, o industrial Napoleão Moreira, o escritor Emer Vasconcelos, a poeta e atriz Anilda Leão, dentre outros.

Esses encontros literorrecreativos ocorriam em residências de amigos ou nos bares, como o antigo Bar das Ostras, no banho da Bica da Pedra ou apreciando a lagoa Mundaú, bebericando no Pontal da Barra.

As honrarias e o reconhecimento em vida aconteceram e foram muitos, mas a maneira simples de viver e de encarar a vida o imortalizou. As academias − brasileira, alagoana de Letras e a brasileira de filologia e outras instituições a que pertenceu − não foram mais importantes do que o reconhecimento popular.

A imorredoura consagração aconteceu naturalmente fruto do valor de sua obra, sem que houvesse qualquer campanha de marketing. O reconhecimento popular de um trabalhador intelectual no Brasil não é tão comum assim. Aurélio conseguiu.

Indicação de leitura:

Marcos Vasconcelos Filho
Marulheiro – viagem através de Aurélio Buarque de Holanda
Maceió -Edufal, 2008, 339 p.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Os filósofos do futebol brasileiro

O comentarista esportivo João Saldanha



“Se concentração ganhasse jogo, o time da penitenciária seria campeão invicto.”

“Quando o presidente Médici formou o gabinete dele, não me consultou; de modo que para formar o meu time, não preciso perguntar a ele.”

“Meu time é formado por onze feras. É preciso desafrescalhar essa história de canarinhos.”

“Pelé é para o futebol brasileiro o que Shakespeare é para a literatura inglesa.”

“Quatro homens, um ao lado do outro, só em parada militar.”

“Se macumba ganhasse jogo, o campeonato baiano terminaria empatado.”

“Campo de futebol não é loteamento. Ninguém é dono de lote, de posição fixa.”

João Saldanha [1917 – 1990]. Nasceu em Alegrete [RS] e morreu em Roma. Jornalista, radialista, técnico de futebol, escritor. Foi um dos mais polêmicos comentaristas de futebol do Brasil. Desde muito jovem militou no Partido Comunista Brasileiro [PCB]. Em 1969 foi o treinador que classificou a seleção brasileira de futebol para a Copa do mundo de 1970, quando o Brasil ganhou o tricampeonato mundial de futebol.

Fonte: 90 Minutos de Sabedoria – A filosofia do futebol em frases inesquecíveis. Seleção e organização de Ivan Mauricio, editora Garamond, 2002.


domingo, 2 de maio de 2010

Marcus Vinicius

O cantor Ivon Curi (de gravata borboleta), Maria Cândida, Marcus Vinicius e Luiz de Barros

(*) Marcos de Farias Costa


Na minha imodesta opinião, Marcus Vinicius (Pão de Açúcar/AL, 14/2/1937-Maceió, 7/5/1976) foi o maior cantor alagoano de todos os tempos. Justificarei, ao rolar das linhas, a empolgada afirmativa. Não escrevi “seresteiro” porque ele não foi somente um cantor de serestas. Marcus Vinicius era um intrépido intérprete de sambas e de outros gêneros, na sua voz grave e sonora, de timbre aveludado, com entonação de barítono e leve impostação lírica.

Na época em que frequentava o Bar da Jaqueira ninguém interpretava igual a ele o praticamente correto Samba da bênção (Vinicius de Morais/Baden Powell, lançamento em 1966) ou a plangente Modinha (Sérgio Bittencourt, lançada em 1968), ou mesmo a clássica canção Chão de estrelas, do genial Orestes Barbosa (em parceria com Sílvio Caldas e lançada em 1937). O seu repertório era extenso e intenso, desde ralentados sambas-canções até lépidas e velozes marchinhas carnavalescas e outros gêneros, passando pelo fox, a valsa, o bolero (Ansiedade, do alagoano Antonio Paurílio, que só ele cantou a primeira parte e que não foi gravada “completa” por Alcides Gerardi, em 1952), o tango e outras variedades de canções.

Uma noite eu saía de um barzinho situado na Praça do Pirulito e passei no mercado público para comprar cigarros. Aproveitei e pedi uma saideira no balcão, e depois uma cerveja pra lavar a “prensa”, quando ouvi uma voz afinadíssima crescendo na noite. Apurei os ouvidos e percebi que alguém cantava o samba Chuvas de verão, de Fernando Lobo (lançado em 1949, na voz de Francisco Alves e regravado por Caetano Veloso, quase duas décadas depois). Apurando a visão, reconheci o cantor que vinha a pé, acompanhando-se ao violão e fazendo uma solitária serenata noturna em via pública. Era o Marcus Vinicius e vinha de grossa farra lá do Bar de “Seu” Didi. Para os mais jovens eu informo que o “Seu” Didi era o proprietário do frequentadíssimo Bar da Jaqueira, espécie de bunker lírico-musical dos anos 60, para os estudantes que entediados e revoltosos com a ditadura militar dos anos de chumbo, buscavam boa música e papos amenos e menos politizados.

Dizem que Nélson Gonçalves ao ser entrevistado e inquirido se haveria algum cantor no Brasil cuja voz se equiparasse com a sua, de supetão o cantor gaúcho gago disparou: “Marcus Vinicius, lá de Maceió”. Não sei se é verdade ou lenda, mas isso foi muito comentado em Maceió, em meados da década de 60, e entre a lenda e o fato eu fico com a lenda.

Certa manhã eu bebericava com o compositor Juvenal Lopes — no Bar do Chope, por volta de 1986 — quando um grupo de estudantes veio nos perguntar quais os dois maiores cantores alagoanos de todos os tempos. Nem titubeei: Augusto Calheiros e Marcos Vinicius. Juvenal, ao lado, sorriu, concordando.

Infelizmente Marcus Vinicius não deixou sua voz documentada em disco; só em precários registros em gravadores de rolo: uma dessas gravações eu ainda possuo, ele cantando e sendo acompanhado pelo pianista Nelson Almeida. Estas fitas antigas devem estar em extinção, e as que restam se encontram nos arquivos implacáveis dos colecionadores ou pesquisadores de música popular. Se Alagoas fosse um estado que valorizasse e preservasse os seus artistas, teríamos convertido para CD a única e última possibilidade sonora de resgate vocal deste extraordinário cantor, com arranjos modernos e participação dos artistas da terra. Mas isso seria sonhar acordado e com o ovo no uropígio da galinha.

Quando hospitalizado e com a saúde ameaçada, o boêmio e cantor Marcus Vinicius recebia os amigos da melhor maneira possível: além do bom papo habitual que era a sua marca registrada, ligava o passa-disco e ficavam horas escutando os clássicos da MPB, os seus ídolos Chico Alves, Sílvio Caldas, Orlando Silva e outros cartazes de sua preferência, buscando sofrear os que, emocionados, ameaçavam cair no choro. Os que o acompanharam no momento do último mistério afirmam que ele morreu cantando, como o poeta e visionário inglês William Blake.

Conheci Marcus Vinicius pessoalmente e uma vez apresentei-lhe um projeto de espetáculo musical no Teatro Deodoro (um dos milhares que morreram na gaveta do esquecimento), onde ele interpretaria o repertório dos grandes compositores do passado, como João da Baiana, Pixinguinha, Caninha, Donga, Sinhô, Brancura, Bide, Nilton Bastos e Ismael Silva, entre outros craques. Aí ele comentou, lúcido e entusiasmado: “Estes são os pioneiros!”. E seguimos pro bar do Eliel, situado na Rua Cincinato Pinto, para afogar as mágoas com mais uma meiota de cachaça. Mas sem esquecermos a chalaça.

E volto a repetir em minha festa imodesta que Marcus Vinicius foi o maior e melhor cantor alagoano de todos os tempos. Com a diferença que cantava grosso e não usava tatuagem nem brincos. Até amanhã − se Deus quiser.

(*) Colaborador do blog e testemunha ocular e contemporâneo dos fatos aqui relatados.

Jornalista, poeta e cantor

Marcus Vinicius trabalhando como desenhista
Marcus Vinicius fotografado na biblioteca de sua casa

Os jornalistas Zadir Cassela e Marcus Vinicius

Marcus Vinicius e Reinaldo Costa no Bar da Jaqueira

Geraldo de Majella

Marcus Vinicius Maciel Mendonça [1937-1976], jornalista, poeta, compositor e desenhista, nasceu em Pão de Açúcar, Alagoas, no dia 14 de fevereiro de 1937. Filho de Aldemar de Mendonça e Zelina Alves Maciel. Estudou inicialmente em Pão de Açúcar. Em 1949, transferiu-se para Maceió, onde continuou os estudos. O seu primeiro emprego foi no extinto Fomento Agrícola, órgão do Ministério da Agricultura, na função de desenhista, em 1955.

Mas foi como jornalista e músico que se tornou uma figura conhecida e querida dos boêmios e da intelectualidade alagoana a partir da segunda metade da década de cinquenta. Em 1959, entra para o Diário de Alagoas, órgão do grupo político do governador Sebastião Marinho Muniz Falcão.
Foi com o pseudônimo de Ícaro que ficou conhecido na imprensa de Alagoas, tanto no Diário de Alagoas como na Gazeta de Alagoas, para onde se transferiu em 1964, sempre encarregado pela edição do que na época se chamava de “Sociedade”, e que depois passou a ser a coluna social.

Já conhecido nas rodas sociais de Maceió, figura requisitada para as festas, reuniões e bailes nos principais clubes da capital alagoana, Ícaro era um dos mais importantes e assíduos frequentadores do Bar Jaqueira. Os seus amigos de boemia e música eram Aldemar Paiva, Nelsinho Almeida, Bercelino Maia, Reinaldo Costa, Juvenal Lopes, Setton Neto, entre outros.

A sua permanência na imprensa diária durou cerca de quinze anos [1955-1970]. Foi em 1970, ano em o Brasil conquistou o tricampeonato mundial de futebol, que deixou de trabalhar como jornalista profissional e retornou à antiga função de funcionário público federal como desenhista do Ministério da Agricultura.

O radialista, compositor, humorista e escritor alagoano Aldemar Paiva, um dos seus melhores amigos, escreveu a respeito, ao saber que Marcus Vinicius havia morrido de câncer na noite do dia 7 de maio de 1976:

“Ícaro, ele se assinava assim, o meu amigo Marcus Vinicius Maciel Mendonça, 39 anos, jornalista, seresteiro das Alagoas.

Meu amigo de Maceió morrendo às 23 horas do dia 7, seu corpo sendo levado para o Parque das Flores. Um lugar lindo, que andei visitando outro dia, em Maceió. Lugar bom para se ficar enterrado. Comércio de flores... Ouvindo orações... Tranquilo, belo, sossegado. Ali está Ícaro, o meu amigo.

Ícaro pegava o violão com o mesmo desembaraço com que usava a máquina de escrever e compunha. Ele não queria ser um profissional. Era o seresteiro anônimo.”

A nota triste foi Marcus Vinicius não ter conseguido deixar registrado em forma de disco a sua voz. Pesou talvez para Marcus e para muitos outros as dificuldades financeiras e práticas em gravar um long-play (LP). Resta-nos a memória dos que conviveram e ouviram a voz desse importante intérprete alagoano.

Fontes: Pão de Açúcar – Cem anos de poesia – Coletânea. Etevaldo Amorim [organizador], Ecos Gráfica e Editora, Maceió, 1999, p. 65/66.