sábado, 19 de junho de 2010

O menestrel Aldemar Paiva

Noite de lançamento do livro: Saga do 44º Espada D' Água em Recife

Claudionor Germano, Carlito Lima Aldemar Paiva e Cidinha Madeiro

Aldemar Paiva no Teatro Santa Isabel em Recife

Aldemar Paiva, o livreiro João Luiz, a cantora Leureny no Bar Canto dos Cantos em Maceió

Zana Vilela e Aldemar Paiva descerrando a placa da Academia da Boemia de Alagoas

Carlito Lima, Cidinha Madeiro e Aldemar Paiva antes do jantar
Aldemar Paiva apagando as velinhas no seu 81º aniversário.

Cidinha Madeiro, Gorete Lima, Pedro Cabral, Aldemar e Bolotinha no Bar Canto dos Cantos

Geraldo de Majella


Aldemar Buarque de Paiva, filho de Mário Fortunato de Paiva e Maria Luiza Buarque de Holanda Paiva, nasceu em 20 de julho de 1925, na Rua do Macena, no Centro de Maceió, capital do Estado de Alagoas. Esta rua é um dos cenários do romance Angústia, escrito por Graciliano Ramos. Ao completar 23 anos, participou da inauguração da Rádio Difusora de Alagoas – ZY0-4.
A voz de Aldemar foi a primeira que se propagou − através das ondas do rádio − ao transmitir a solenidade de inauguração, no dia 16 de setembro de 1948, da primeira rádio de Alagoas. Este fato já o colocou na história da radiofonia brasileira.

Mário Marroquim era o diretor-geral da emissora, e Aldemar Paiva exerceu as funções de diretor artístico e de programação. O seu talento logo foi percebido pelos colegas e mais ainda pelos ouvintes da emissora pioneira de Alagoas.

A sua permanência no rádio alagoano foi curta: teve duração de apenas dois anos. Em 1951 foi trabalhar no Rádio Clube de Pernambuco – PRA-8 e no dia 20 de dezembro de 1952 começou um dos mais duradouros programas de rádio do Brasil, o Pernambuco, Você é Meu. Depois de dezesseis anos trabalhando no Rádio Clube, mudou de emissora e em 1968, foi trabalhar na Rádio Jornal do Comércio. Lá, continuou com o programa Pernambuco, Você é Meu até outubro de 1977.

Pernambuco, Você é Meu ficou no ar em duas estações de rádio durante 25 anos. Nesse período foi um dos mais importantes programas do rádio daquele estado. A música de qualidade foi sempre o que o norteou.

Aldemar Paiva fez parcerias com os músicos Rossini Ferreira, Inaldo Vilarim, Beto do Bandolim, José Meneses, Zé Gonzaga, Juraci Alves e o maestro Nelson Ferreira. A dupla Aldemar e Nelson Ferreira, seu parceiro mais constante, compôs: Bloco do Ataulfo, Saudade, Ninguém segura este Recife, Pernambuco, você é meu e Tem jeito, sanfona.

Lourenço Capiba, um dos ícones da música brasileira, amigo da vida inteira; nem por isso se tornaram parceiros de muitas músicas. Os dois até fizeram algumas músicas em parceria, que ainda não foram gravadas. Estão guardadas no arquivo de Aldemar.

Não há precisão – pelo menos eu não tenho −, nesses 62 anos de vida artística, quanto ao número exato de músicas que Aldemar Paiva gravou ou outros cantores gravaram: de sua autoria ou em parcerias. A sua memória só alcança até o momento 62 composições gravadas.

Em seu escritório de trabalho estão nas gavetas cerca de dez músicas à espera de cantores, ou que ele ainda não apresentou aos seus amigos − entre estes, o mais importante cantor de frevo, Claudionor Germano, para que sejam gravadas.

Esse homem multimídia tem sido reconhecido pelo valor como compositor, humorista, radialista, escritor, cordelista, em Recife e em outras cidades do Brasil. Foi agraciado com o título de cidadão pernambucano, mas nunca deixou de cantar a sua terra natal, Alagoas.

A Difusora foi inaugurada e Maceió ganhou uma bonita música, um hino. Verdadeiramente, a música Pajuçara de Aldemar Paiva deveria se tornar o hino oficial de Maceió. A primeira vez em que essa música foi executada foi no dia 16 de setembro de 1948, na inauguração da rádio. Muitos anos depois a cantora alagoana Leureny gravou e assim a imortalizou num long play.

Desde esse momento Pajuçara entrou no coração dos alagoanos de Maceió e também no coração dos que para cá chegaram ou ainda estão chegando para viver junto ao mar e à sombra dos coqueirais.

A música Pajuçara tem para Maceió a mesma importância que Copacabana, música de João de Barros, tem para a cidade do Rio de Janeiro. O amor devotado à sua terra é uma marca na sua obra de compositor, humorista, radialista, escritor. Em vários momentos da sua vida cantou Maceió e suas belezas naturais.

Aldemar é o nosso menestrel.


Pajuçara

Eu que conheço meu Brasil
Sei muito bem
Das lindas praias, coqueirais, que ele tem
Por isso afirmo nestes versos que compus
Em Pajuçara há mais encanto, há mais luz
Pajuçara, onde o mar beija as areias
Com mais alma e mais amor
Pajuçara, lindo berço de sereias
Que nos deu o criador
Pajuçara que refletes num sorriso
O teu coqueiral em flor
Tens uma beleza rara
Pajuçara.
Fotos de Cidinha Madeiro

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Poeta, compositor e boêmio

Homenagem prestada ao poeta Paulo Renault


O poeta declamando no Bar Nação Caeté

Paulo Renault, Chico de Assis e o ex-jogador de futebol Jorge Siri

Paulo Renault e Chico Elpídio seu principal parceiro

Capa do Livro

Geraldo de Majella


Paulo Renault Braga Villas Boas [1958-2003], poeta, compositor, funcionário público, trabalhou na Fundação Cultural Cidade de Maceió e Fundação Teatro Deodoro – Funted. Antes havia trabalhado como vendedor da Brahma. Nasceu em Maceió no dia 29/10/1958 e faleceu em Maceió no 19/11/2003. Filho de Renault Paranhos Villas Boas e Leda Braga Vilas Boas. Cursou até o 3º período de administração de empresas no Centro de Estudos Superiores de Maceió - CESMAC. Casou-se com a professora Márcia Maria Lima Villas Boas; o casal teve dois filhos, Rodrigo e Sergio Lima Villas Boas.

A política foi um dos assuntos que mais atraiu Paulo Renault, além da poesia e da boemia. Tinha nas veias o sangue do histórico militante comunista Júlio de Almeida Braga, seu avô e um dos fundadores em Alagoas do Partido Comunista Brasileiro – PCB, razão fundamental de tanto falar do avó e de relatar em segunda mão as proezas do velho comunista nas prisões e durante a vida de operário e inventor de instrumentos mecânicos.

Paulo Renault ousou na juventude entrar para a militância política no antigo PCB, mas logo admitiu não ser essa a sua opção de vida. Pediu “baixa” do PCB e seguiu o seu caminho de poeta e compositor. O que de fato estava certo, pois a política partidária não seria o melhor caminho para ele trilhar.

Paulo Renault foi parceiro de Chico Elpídio, Eliezer Setton, Marcondes Costa e Carlos Moura, dentre outros. Das músicas compostas em parceria com os amigos, algumas foram gravadas. A temática de suas composições foi sempre focada na condição social do ser humano, seus desejos e suas fraquezas, com influências da bossa nova, da música de raiz nordestina e da MPB.

Integrou um dos mais importantes grupos musicais de Alagoas, o Grupo Terra. Esse conjunto musical foi criado no final dos anos 70 e permaneceu até o início dos oitenta. Márcia, sua companheira, diz que ele “possuía aguçado senso musical e uma voz privilegiada, com um agudo incomum, e que a sua relação com o violão – instrumento de sua predileção − era apenas a de um pretenso tocador, pois não se dedicava com a profundidade que gostaria ou deveria”.

Os músicos que constituíram o Grupo Terra se tornaram uma referência da sua geração. Entraram de corpo e alma na produção de música alagoana, com forte influência do estilo regional. Durante a década de 70 despontavam no cenário artístico nacional grupos musicais como o Quinteto Violado e a Banda de Pau e Corda ambos pernambucanos.

A motivação dos músicos era também a do compositor Paulo Renault, que tinha como uma das suas características pessoais o entusiasmo e a grandiloquência. Talvez por ser dessa maneira, “mergulhava de cabeça” em tudo que escolhia.

A passagem pelos vários órgãos públicos de cultura era, além do seu oficio, um caminho para tentar se expressar politicamente no ambiente artístico e cultural das Alagoas.

Autodidata

O temperamento irrequieto o conduziu por toda a vida – curta, é bom que se destaque. Morreu com apenas 45 anos. Era autodidata; sem que nunca houvesse estudado direção teatral, codirigiu com Paulo Déo, em 1995, uma peça do consagrado escritor gaúcho Moacyr Scliar, Introdução à Prática Amorosa.

Três anos depois, em 1998, ajudou a montar o espetáculo Maceió Cidade Aberta, com o seu amigo o cantor e compositor Chico Elpídio. Esse show foi baseado numa de suas obras, e os poemas foram musicados por Chico Elpídio. A direção ficou a cargo do experiente diretor José Márcio Passos.

O trabalho como produtor musical também o atraia e por muitos anos produziu shows de cantores alagoanos como Eliezer Setton, Leureny Barbosa, Nara Cordeiro, Wilma Miranda, entre outros. O envolvimento na produção não era restrito à montagem formal do espetáculo apenas mas acabava se envolvendo muitas vezes na escolha do repertório; opinava sobre os arranjos musicais e até mesmo sobre a apresentação no palco de cada um dos artistas.
Livros

A Saga do Toureiro é o primeiro livro, com 18 poemas inéditos, editado pela FUNTED em 1990. O livro fez parte da coleção Palco e Luz. Os poemas são críticos ao mundo capitalista globalizado, onde a ideologia do individualismo domina o mundo e transforma os seres humanos em objetos e/ou máquinas de consumo.

Quando Paulo Renault morreu, Maceió Cidade Aberta estava sendo produzido. Os 25 poemas que compõem o livro foram ilustrados por Mário Aloísio, arquiteto e seu amigo. Só em 2004 foi publicado pela Editora Catavento.

Maceió Cidade Aberta é um conjunto de poemas em que a cidade e sua gente são retratadas. A identidade do poeta com a cidade natal rende muito mais que uma ode. É possível se perceber o que liga um poeta marginal aos marginalizados sociais. É a denuncia do cotidiano mais cruento, são os encontros e desencontros ocorridos entre Paulo Renault e Maceió.

A cidade que sucumbe diante da miséria a que sua gente é arrastada é a mesma cidade em que o poeta foi criado e andou pelos becos, ruas, avenidas, cruzou córregos e se banhou na lagoa Mundaú e no mar. O descaso e o sofrimento do povo e da cidade se confundem com a vida do poeta que romanticamente quer vê-la aberta, livre da miséria e feliz.

Renault produzia lentamente. Publicou apenas dois livros com 43 poemas; deixou outros poemas inéditos, letras de músicas e textos esparsos que merecem ser organizados em outro volume, para assim completar a sua obra.

O boêmio

A boemia era uma das atividades que lhe davam prazer desde a adolescência. O bate-papo em bares, restaurantes e botecos, nas casas mais seletas ou na periferia, não o incomodava e da sua boca ninguém ouviria nenhum comentário ou resmungo. O boteco com três mesinhas à beira do riacho do Salgadinho era um termômetro da sua satisfação.

Agora imaginem os finais de tarde no Largo do Mercado de Jaraguá, no alegre Buraco da Zefinha? Um típico pé-sujo da cidade, mas que durante muitos anos foi frequentado por boêmios de várias extrações sociais. Era o local onde o poeta pontificava com mais assiduidade.

O samba cantado pelo cantor Zé Paulo era o que havia de melhor e diferente nas tardes de sábado em Maceió. O velho cantor de samba, com seus óculos escuros, adorno que o identificava muito mais que o documento de identificação, o RG.

Os intervalos invariavelmente eram destinados aos recitais dos poemas de sua autoria ou de outros poetas. Os amigos, depois de tomar muitas, insistentemente solicitavam que Paulo Renault declamasse Vou embora pra New York, o seu mais conhecido poema. Era um delírio embebido no álcool. Palmas, assovios, gritos e mais bebidas, sempre.

No entorno do Buraco da Zefinha e do Poeta se formou uma confraria em estilo profundamente anárquico, e até foi criado um bloco de carnaval chamado Família Josefina. O bloco desfilou apenas um ano pelas ruas do bairro. O poeta foi um dos destaques. Fantasiado, desfilou pelas ruas e becos de Jaraguá. O ponto alto foi o momento em que solenemente foi afixada uma placa em homenagem à Rapariga (prostituta) Desconhecida.

O território mais conhecido das prostitutas em Maceió recebeu em pleno carnaval essa singela homenagem póstuma. Nada mais justo do que se prestar uma homenagem pública às trabalhadoras do sexo.

sábado, 12 de junho de 2010


No centro a Catedral de Londrina

Visão panoramica de Londrina em 1977
Geraldo de Majella

Marco Antonio Galante nasceu em Londrina, norte do Paraná, em 1958, cidade onde passou a infância e adolescência. Adolescente, trabalhou como comerciário, pouco tempo antes de entrar por concurso público para o Banco do Brasil. Durante quinze anos foi um dedicado funcionário do BB; trabalhou em Sinop, cidade do Mato Grosso, na fronteira com o Pará, foi transferido para Sorocaba, no interior paulista, voltou para o Centro-Oeste, foi para Corumbá no Mato Grosso do Sul, fronteira do Brasil com a Bolívia.

Levava uma vida assemelhada à de cigano, mudando de cidade em cidade. Exerceu várias funções no banco. Mas, em 1990, conheceu Maceió e outras cidades do litoral alagoano durante as férias. O casal Marcão e Cláudia – ela também funcionária do Banco do Brasil − voltou apaixonado pela cidade. Um pensamento passou a atrair o casal: morar em Maceió. O mar, o sol e a vida tranquila eram possibilidades reais de uma mudança na vida para ambos, que viviam cansados do interior do Brasil.

Deixar o Banco do Brasil era um plano que se concretizaria pouco tempo depois da transferência para Maceió. Montar uma casa de massas era a ideia que o perseguia.

Sua experiência anterior ao Mamma Mia era apenas como um bom garfo. Comer macarrão e as deliciosas massas feitas pela sua Nona [avó] nos almoços dos domingos em Londrina, nada mais que isso. Os avós paternos eram originários da província de Rovigo, na região de Vêneto, e chegaram ao Brasil no início do século XX.

A casa de massa Mamma Mia foi montada com a ajuda de um amigo que tinha experiência e deu uma mãozinha na compra dos equipamentos. Em três meses os funcionários foram treinados e a casa de massas, que funcionou inicialmente na Pajuçara, abriu ao público e passou a ser um ponto de encontro de bancários, sindicalistas, advogados, glutões em geral.

Esse descendente de italiano, que fala pelos cotovelos, gesticula − característica dos italianos −, torcedor fanático do Flamengo e do piloto Nelson Piquet, não quer trabalhar em mais nada que não seja na atividade que abraçou de corpo e alma: a casa de massas.

Desde 2009 se mudou para a avenida Amélia Rosa e se associou à sorveteria Bali, a melhor da cidade. Os clientes agora podem se deliciar com massas caseiras como prato principal e tomar sorvete na sobremesa.

Os principais restaurantes, buffets e barracas de praia de Maceió são seus clientes. Os pastéis, salgadinhos e massas produzidos no Mamma Mia são degustados em muitas outras casas da cidade.

Marcão é bem-humorado, conversa com os clientes, mas trata a sua atividade com profissionalismo. Ao decidir montar uma casa de massas, treinou os funcionários – a maioria deles vem desde o início − e instalou a cozinha dentro dos padrões exigidos pela Vigilância Sanitária e pelo Corpo de Bombeiros.

O Mamma Mia tem uma cozinha comandada por dois craques, os chefes Reinaldo Damião e Vera [Verinha] de Lira, que se revezam durante os três turnos de trabalho.

Já que estamos falando de comida, só resta dizer, sem perda de tempo:
− Marcão, um talharim à bolonhesa, dois pastéis e uma cerveja geladíssimaaaaa!!!



Onde fica:

Mamma Mia
Avenida Amélia Rosa, 1004
Jatiúca – Maceió – Alagoas
Fone: 3327-4553

sábado, 5 de junho de 2010

Em La Boca, Maradona é o cara


Fotografado junto a estátua de Maradona no Museu do Boca Juniors

O poeta Sidney Wanderly junto a Maradona na frente do estádio de La Bombonera

Sósia de Maradona em Caminito


Após o despacho andamos pelas ruas de Caminito

Tomando café ao lado do estádio de La Bombonera

Lateral do estádio de La Bombonera



Geraldo de Majella


A Boca é um dos bairros da cidade de Buenos Aires onde quem reina é Diego Armando Maradona. Em toda a Argentina ele é ídolo inconteste, mas no bairro em que nasceu e se projetou para o mundo, é sem favor algum o dono do pedaço.

O bairro portuário recebeu os imigrantes espanhóis e italianos desde o final do século XIX, quando desembarcaram para trabalhar na Argentina e construir uma nova vida em solo portenho.

Os italianos, genoveses a maioria deles, trabalhadores pobres, construíram um bairro com o que podiam e encontravam pela frente: resto de madeiras das embarcações, placas de metal, enfim, tudo que podia ser aproveitado. As pinturas das casinhas em cores fortes era o resultado da sobra das pinturas realizadas nos navios.

As casinhas coloridas foram denominadas Caminito, pequeno logradouro encravado no bairro da Boca, que depois veio a dar nome ao tango que ajudou a consagrar Carlos Gardel.

Essa ambientação inusitada na cidade é há muito tempo uma das atrações de Buenos Aires. Mas os imigrantes não vieram apenas para trabalhar no porto, criaram os dois maiores clubes do país: o Boca Juniors e o River Plate.

O River Plate depois se mudou do bairro e foi para a região de Belgrano, área nobre e em expansão da capital. Na Boca foi criado o mais emblemático estádio de futebol da Argentina, o La Bombonera.

Foi no alçapão de La Bombonera que Maradona apareceu para o mundo. De lá avisou que iria comandar com talento e garra a seleção argentina de futebol. De fato isso aconteceu. Durante mais de uma década foi o maestro argentino nos campos. Conquistou um título mundial e protagonizou inúmeras polêmicas, um dos seus hobbies.

Passando alguns dias em férias por Buenos Aires em companhia do poeta Sidney Wanderley, resolvemos ir ao território de Diego Maradona, La Boca. In loco, constatamos o que já era sabido: os moradores desse bairro são antes de tudo fanáticos admiradores do maior jogador de futebol da Argentina de todos os tempos.

O futebol sempre foi um ponto de discórdia entre brasileiros e argentinos. Ao se aproximar a Copa do Mundo, nós dois, homens de pouca fé, resolvemos apelar: deixamos um despacho na encruzilhada mais famosa de Buenos Aires, a da linha ferréa que passa ao lado do estádio do Boca Juniors.

Maradona treinador da seleção argentina continua o polemista que todos conhecemos. Os efeitos não são os mais promissores, mas como tivemos a colaboração de pais de santos amigos, ficou mais fácil e admitimos essa possibilidade mesmo em férias por Buenos Aires.

Macumba não ganha jogo, mas pode ajudar. Ah, isso pode! Pai Reinaldo garantiu. O despacho foi caprichado: uma galinha de penas brancas, pois não conseguimos uma preta, duas garrafas de vinho tinto Malbec, dois charutos cubanos, duas carteiras de cigarros, dois quilos de sal grosso, dois litros de azeite de oliva (na falta do azeite de dendê) e duas caixas de fósforo.
O vermelho e o preto são as cores de Exu, e as oferendas que encontramos na cidade natal de Borges foram essas.

Ainda pedimos em voz baixa aos Exus que façam com que os argentinos, caso consigam chegar a jogar contra o Brasil, venham de pernas amarradas, sem grandes iniciativas em campo. Apenas isso; nada de mal lhes desejamos, nem os Exus se prestam para isso.

Esse nosso pedido deve-se única e exclusivamente à burrice e teimosia do treinador Dunga, que convocou uma seleção de amigos sinceros e leais. Dunga deveria ser governador do Lions Clube e não treinador da Seleção Brasileira de Futebol. O exemplo maior e supremo foi a convocação do Kleberson. Vade retro, satanás!

Os meninos do Santos e do Brasil, bons de bola e de ginga, não foram convocados. Pode?

Restou-nos, em Buenos Aires, apelar para os Exus: Tranca-Rua, Pomba-Gira, Zé Pilintra e assemelhados. Quem sabe eles neutralizam los hermanos argentinos. Mas há outras seleções também para quem estendemos os nossos pedidos: Alemanha e Itália, nossas tradiconais rivais em Copas do Mundo.

Figa para eles e para Dunga.

Apesar deles, vamos ganhar mais um caneco.

Axé!

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Livro aponta influência da imprensa na queda de Saldanha em 1970



Técnico da seleção brasileira entre janeiro de 1969 e março do ano seguinte. João Saldanha classificou o país para a Copa de 1970 com seis vitórias em seis jogos e montou o time-base (as famosas “feras do João”) que iria ganhar o tricampeonato no México. Com seis vitórias em seis partidas, o time comandado por Zagallo é considerado, por muitos, a maior seleção da história. Quarenta anos depois, a história desta conquista ainda provoca discussões sérias, todas elas relacionadas aos acontecimentos que levaram à demissão de Saldanha.

“Quem Derrubou João Saldanha”, de Carlos Ferreira Vilarinho (livrosdefutebol.com, 254 págs., R$ 50), chega às livrarias para apimentar este debate. O livro faz uma reconstituição minuciosa da cobertura de jornais, rádios e revistas com o objetivo de mostrar as diferentes forças que se digladiavam em torno da seleção brasileira no período e tenta esclarecer o papel de cada uma delas na ascensão e queda do treinador.

A tese mais aceita até hoje é de que Saldanha foi demitido por uma série de erros que cometeu, a saber: peitou o general Médici, que queria a convocação de Dada Maravilha; ameaçou um de seus críticos, o técnico Yustrich, com um revólver; aceitou trabalhar para as organizações Globo ao mesmo tempo em que dirigia a seleção; e cogitou deixar Pelé no banco, por considerá-lo sem condições de jogo, e ainda disse que o craque era míope.
Vilarinho rejeita esta tese. Para o pesquisador, Saldanha foi demitido porque seria inaceitável para a ditadura militar ter um comunista, crítico do regime, no comando da seleção caso ela fosse campeã mundial. O pesquisador sugere, com a sua pesquisa, que alguns problemas enfrentados pelo técnico teriam sido provocações orquestradas para tirar Saldanha do sério ou teriam ganhado uma dimensão maior do que mereciam com o objetivo, exatamente, de destroná-lo.

Embora não disponha de elementos concretos para justificar as suas suspeitas, Vilarinho apresenta alguns dados que não costumam ser lembrados nas tradicionais reconstituições do período. Um dos alvos do pesquisador é o jornalista Armando Nogueira (1927-2010), então titular de uma coluna no “Jornal do Brasil”, que em mais de uma ocasião transmitiu “recados” do general Médici a Saldanha, entre os quais um “esclarecimento” do chefe de relações públicas da Presidência, dizendo que Médici “gostaria de ver o Dario, do Atlético, entre os vinte e dois da seleção”.

Vilarinho também não aceita a tese difundida de que Zagallo alterou peças fundamentais do time de Saldanha e mudou o esquema de jogo, de 4-2-4 para 4-3-3, para rumar em direção ao título no México. Em 1968, ainda como jornalista, Saldanha “escalou” o seu time preferido para a Copa: Como goleiro, Felix, Ubirajara ou Picasso. “Tanto faz”, disse. “Uma linha de quatro formada por Carlos Alberto, Brito, Piazza e Rildo. Imediatamente à frente destes quatro, o Gerson. Um pouco mais à frente, formando uma linha de dois homens, o Dirceu Lopes e o Tostão. Mais à frente ainda, outra linha de três com Jairzinho, Pelé e Edu”.

Este “4-1-2-3” e esta escalação são muito semelhantes à formação tática e aos jogadores que venceram o tri no México, com Felix; Carlos Alberto, Brito, Piazza, Everaldo; Clodoaldo, Gerson, Rivellino; Jairzinho, Tostão e Pelé.

Além de colocar pimenta nesta discussão interminável, “Quem Derrubou João Saldanha” tem outro mérito. Ao apresentar em detalhes a trepidante cobertura da mídia a respeito dos preparativos para a Copa de 70, nos lembra que seleção brasileira sempre foi um assunto apaixonante, sem unanimidade, capaz de tirar do sério os mais respeitados cronistas e repórteres, além de envolver interesses variados, nem sempre visíveis.
Fonte:
Blog do Mauricio Stycer

terça-feira, 1 de junho de 2010

Memória & História

A partir da esquerda: Nilson Miranda, joão do Vale, Sérgio Moreira, Miúcha e Teo Vilela


João do Vale e Miúcha na campanha eleitoral de 1982

Geraldo de Majella

A ditadura militar em 1966 havia proibido as eleições para governador. Extinguiu os partidos políticos e continuou cassando direitos e mandatos de parlamentares, aposentando magistrados, prática que se iniciara a partir do dia 1º de abril de 1964, dia em que o presidente João Goulart [1919-1976] foi deposto da presidência do Brasil.

O ano de 1982 estava se delineando em Alagoas como o ano da virada política. A oposição, liderada legalmente pelo PMDB, apresentava dois grandes nomes para as eleições majoritárias: o advogado José Moura Rocha [1933], ex-preso político, já havia enfrentado os candidatos e o casuísmo da ditadura nas eleições de 1978.

O outro nome: Teotônio Vilela [1917-1983] − a figura mais importante daquela época na política alagoana e um dos lideres da oposição no país. Mas, infelizmente, Teotônio foi desaconselhado a concorrer à vaga de senador, pois os médicos num exame de rotina haviam identificado um câncer.

A trágica notícia pegou a todos de surpresa. Não demorou muito e a chapa foi modificada, com a entrada do deputado José Costa [1935] para disputar o governo, sendo José Moura Rocha deslocado para disputar a vaga de senador, em substituição a Teotônio Vilela. O velho menestrel iniciou o tratamento do câncer e permaneceu bravamente peregrinando pelo Brasil afora.

A presença de Teotônio Vilela na campanha eleitoral em Alagoas foi emocionante. Eram visíveis os efeitos da quimioterapia no corpo do senador; a cada instante os militantes dos partidos políticos clandestinos, do PMDB e os eleitores iam se emocionando, aumentando assim a participação nos comícios e nas caminhadas.

Os indicativos da vitória vinham das ruas; o povo carregava os candidatos nos braços literalmente. Nos porões eram montadas as armações, as fraudes. O que de fato ocorreu. Os candidatos da oposição foram derrotados pela fraude eleitoral.

Dinheiro, roubo de urnas, subornos nas cidades do interior de Alagoas. E a pior das coisas: a violência. Assassinatos de políticos, prefeitos, vereadores, candidatos a cargos eletivos – o jornalista Tobias Granja, candidato a deputado estadual, foi assassinado numa das ruas centrais de Maceió.

O crescimento da campanha oposicionista é uma realidade que passou a incomodar. As manifestações ocorrem de maneira organizada pelas ruas na capital e nas cidades do interior. São multidões que estão indo cada vez mais às ruas. Os artistas se engajam no processo de luta pela redemocratização do Brasil.

O cantor e compositor maranhense João [Batista] do Vale [1933-1996] e a cantora carioca Heloisa Maria Buarque de Holanda − Miúcha [1937] entram na campanha de vários candidatos pelos estados, até chegarem a Alagoas para participar da reta final da campanha de José Costa [PMDB] a governador e José Moura Rocha [PMDB] para senador. O comício foi o maior até aquele momento, estimado em mais de 60 mil pessoas na praia de Pajuçara.

O senador Teotônio Vilela, visivelmente abatido pelo câncer, esteve presente e falou para a multidão que o aplaudiu e cantou as músicas da campanha, num grande e afinado coro de milhares de vozes.

A dupla andou pela cidade. João do Vale já conhecia os meandros da cidade, estivera em diversas oportunidades cantando e bebendo na noite maceioense. O Bar da Jaqueira era um dos pontos preferidos do autor de Carcará, Estrela Miúda, Peba na Pimenta, entre outras muitas músicas.

João do Vale era militante do PCB. A direção local do Partido procurou o cantor, que declarou: “Se votasse em Alagoas, votaria em Nilson Miranda e Sérgio Moreira para deputado estadual e federal”. Nilson Miranda era um antigo dirigente do PCB, tinha sido vereador e tivera cassados os direitos políticos e o mandato parlamentar em abril de 1964.

Miúcha, artista com vinculações com a esquerda, também pediu votos para os candidatos do PCB e aliados. João do Vale e Miúcha vestiram a camisa de campanha do jovem advogado Sérgio Moreira e, para evitar qualquer tipo de ciúmes entre os outros candidatos, o fato foi registrado pelos comitês dos candidatos, mas o material só foi enviado à mídia depois do comício.

Os jornais de campanha tanto de Nilson Miranda quanto de Sergio Moreira noticiaram o momento. Teo Vilela [1951] é um dos que aparece na foto, embora na época não exercesse cargo político. A sua estreia na política ocorre nas eleições de 1986, quando é eleito senador, sendo posteriormente reeleito para três mandatos consecutivos, em 1986-1994, 1994-2002 e 2002-2006. Em 2006 foi eleito governador de Alagoas.

Os candidatos da oposição foram derrotados numa das mais vergonhosas eleições da história de Alagoas. A derrota se deu em decorrência da fraude eleitoral e da violência política institucionalizada. Foram eleitos Divaldo Suruagy governador de Alagoas e Guilherme Palmeira senador.