(*) Geraldo de
Majella
O Brasil foi o primeiro país do Cone Sul
a fazer a transição da ditadura militar (1964-1985) para a democracia. O regime
militar resistiu, criou as condições ideais para realizar o que ficou
consignado como a transição lenta, segura e gradual. Em 1979, o general João
Figueiredo, o último ditador, enviou ao Congresso Nacional o projeto de lei que
concedia a anistia para os presos e perseguidos políticos, entre eles os exilados
e banidos.
Em vinte e um anos de ditadura, entidades
da sociedade civil e personalidades do mundo cultural, jurídico, religioso e
político denunciaram nacional e internacionalmente inúmeras violações dos
direitos humanos, como a tortura, prisões, assassinatos e o desaparecimento de
patriotas.
A luta em defesa dos direitos humanos,
para muitos no Brasil, passou a simbolizar em primeiro plano as campanhas pelas
liberdades, contra a censura, em favor do direito a manifestação e organização
de partidos políticos, direitos suprimidos pelo regime militar.
Ao ser concluído o processo de transição,
a democracia foi referendada através de eleições livres e da Assembleia Nacional
Constituinte, que deu origem à nova ordem constitucional. O desmanche do
arcabouço jurídico institucional não aconteceu de maneira automática. As
resistências surgiram em todas as áreas do Estado brasileiro. E os setores mais
comprometidos com a luta antiditatorial de um modo geral se bastaram com a
defesa dos direitos humanos, quando o violador era o Estado ditatorial
brasileiro.
A
sociedade civil demorou a compreender que no momento pós-ditadura, a luta em
defesa dos direitos humanos deveria ser ampla e focada nos setores mais vulneráveis.
As bandeiras propostas inicialmente pelos partidos de esquerda foram se
esvaindo com o lento cessar dos ecos ditatoriais.
O Estado brasileiro mantém-se como um
violador contumaz dos direitos humanos, agora – desde 1988 − regido por uma
nova ordem constitucional, mas com vícios antigos e com um aparelho de
segurança ainda sob forte inspiração do período ditatorial, traduzido no
militarismo adquirido no pós-64.
As políticas públicas implantadas pelo
Estado brasileiro têm os seus principais adversários nos remanescentes do
período ditatorial: corporações militares, parlamentares direitistas,
conservadores identificados com grupos de extermínios, setores da mídia, áreas
do Poder Judiciário, entre outros.
O desafio posto é a transformação das
políticas de promoção, proteção e defesa dos direitos humanos em bases centrais
da política de Estado. Assim como o combate a inflação se transformou numa
quase obsessão nacional e que, ao fim e a cabo, vem logrando êxito independentemente
do partido político que esteja governando.
A afirmação dos direitos humanos não
pode ser uma palavra de ordem, e muito menos um recurso de marketing utilizado pelos governantes em efemérides ou em
solenidades realizadas em salões palacianos. A afirmação dos direitos humanos
se dará na construção de ambientes do Estado brasileiro, nos três poderes. Quando
se tratar da execução das políticas públicas, os três níveis do Executivo (União,
Estados e Municípios) devem atuar em sintonia, no financiamento das políticas,
na execução, na avaliação, no controle e na prestação de contas.
A integração das políticas públicas
modificará, no médio e no longo prazo, a concepção do agente público, resultando
na inevitável transformação da relação entre governos e sociedade. A implantação
de políticas afirmativas de direitos humanos é o caminho mais curto para a
superação da barbárie.
Historiador,
Superintendente de Políticas de Promoção da Cidadania e dos Direitos Humanos da
SEMCDH.
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