terça-feira, 8 de abril de 2014

50 anos do golpe militar (II)


Rubens Colaço discursando na inauguração da rua Jayme Miranda

(*) Geraldo de Majella

        As articulações golpistas civis e militares vinham acontecendo nos estados e nas principais cidades há tempo. Desde o suicídio de Getúlio Vargas os militares das três armas procuravam a melhor oportunidade para deflagrar o golpe, não foi possível impedir a posse de Juscelino Kubitschek, a oportunidade se apresenta alguns anos depois no governo de João Goulart, em abril de 1964.

A partir de 1962 o golpe entra na agenda política do presidente John Kennedy, tendo o embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln Gordon, como o idealizador e estrategista mais qualificado.

Contava com a participação de políticos udenistas e de outras siglas, governadores, senadores e deputados, empresários, religiosos e da quase totalidade da grande mídia nacional fartamente subsidiada por recursos oriundos da Agência Central de Inteligência (CIA), Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad) e Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipês).  

O comandante da 4ª Região Militar, general Mourão Filho, sem que houvesse combinado com os líderes golpistas, desce a serra de Juiz de Fora (MG) em direção ao Rio de Janeiro, na madrugada do dia 1º de abril de 1964, antecipando o golpe.

        Em Maceió, distante 1.948 km, o governador de Alagoas, general Luiz Cavalcante, amanheceu o dia transmitindo e recebendo informações. O aparelho de radiotelegrafia do Palácio dos Martírios funcionou durante a noite e a madrugada do dia 31 março e 1º de abril.

        Os secretários de Estado foram convocados pelo governador em caráter extraordinário. Em depoimento ao autor, o então secretário da Fazenda, Divaldo Suruagy, recebeu em sua residência, no bairro da Cambona, o chefe do gabinete militar coronel Cícero Argolo, convocando-o para uma reunião em palácio.

Suruagy, testemunha privilegiada dos acontecimentos, disse: “[...] O comandante do 4º Exército, general Justino Alves Bastos, através de rádio, tinha aderido à revolução, e o Major Luiz, da UDN, correligionário de Carlos Lacerda, adversário do Jango, decidiu pela Revolução. Era uma questão política. [...] Nós ficamos de 31 até o dia 1º no palácio, reunidos, batendo papo, conversando. Quem comandou o processo das prisões foi o coronel João Mendes de Mendonça, secretário de Segurança Pública, com o apoio do Rubens Quintela e do (Albérico Barros) Barrinhos. Eles transformavam as ordens de prisão em realidade”[1].

O presidente do sindicato dos motoristas de Alagoas, Rubens Colaço Rodrigues, foi o primeiro preso político, no amanhecer da manhã de 1º de abril.

Do livro Rubens Colaço: Paixão e Vida – A trajetória de um líder sindical (Edições Bagaço, 2010), publicamos este trecho.   

Você foi preso no dia 1º de abril? Como se deu a sua prisão?

− Sim. Foi no dia 1º de abril e foi o Rubens Quintela quem executou a minha prisão. Ele parou o carro em que vínhamos de Pernambuco, no Tabuleiro do Martins, por volta das três horas da madrugada, dizendo:

– Você é Rubens Colaço?

– Às suas ordens.

– Está preso?

– Por quê?

Ele falou grosso:

– Nós fizemos uma revolução e vocês perderam; desça, venha cá.

Foi me escorando numa guarita, ali onde foi a Petrobras, Tabuleiro do Martins, e perguntou:

– Onde estão as fardas de guerrilheiros que você foi buscar no Recife, vindas de Cuba?

Falei sério:

– Devem estar aí no carro. Seus homens já devem ter achado.

Mas eu falei aquilo por pura ironia; aí ele engatilhou a metralhadora e disse:

– Olha, a sua vida está nas minhas mãos. Não tome deboche não, que você morre. Eu calado estava, calado fiquei. Ele olhou para mim uns trinta segundos e desengatilhou a metralhadora, botou no ombro e disse:

– Olha, Colaço, vou lhe dar uma oportunidade. Sabendo que se eu estivesse em suas mãos você não me daria.

Ordenou para os seus esbirros que estavam parados em pé, observando o diálogo:

– Levem o homem.

O que ocorreu em seguida?

− Nos levaram direto para a Secretaria do Interior e Segurança Pública, na Praça dos Martírios, depois para a penitenciária. Estranhei o fato do Expedito, o Expedito de..., era um rapaz funcionário da Petrobras, não me lembro o sobrenome dele. Nós ficamos presos e ele foi num carro especial para casa, onde os pais dele moravam, na usina Utinga Leão.

E vocês foram levados presos para a penitenciária?

− E nós fomos levados para a penitenciária, já amanhecemos o dia na cela 12. Fomos os primeiros a chegar. Quando foi às oito horas da noite, a cela 12, onde nós estávamos, que só cabia 24 homens deitados marcando cartão um no outro, tinha 28; então 12 ficaram na grade, na porta de entrada, e 12 ficavam na janela, que dava para o sanitário, acordados; aí depois, quando cansavam, iam para lá, fazíamos um revezamento, tinha sempre quatro acordados e 24 marcando cartão um no outro. O mesmo acontecia nas demais celas, na 13, em todas, enfim. No dia 4 de abril éramos 151 presos.

(*) Historiador.

 

 

 

 

 

 



[1] Entrevista ao autor prestada no dia 19 de fevereiro de 2000.

 

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